1.7.14

''QUANDO UM FILHO MORRE, TODAS AS MÃES SENTEM''

Via Cinza sem Filtro - 

Mais uma vez a favela foi às ruas e pautou o debate em meio ao efeito Copa. As lágrimas da favela e na favela definitivamente não valem mesmo nada. Isso constatamos a cada dia, seja na compra de mais veículos blindados para o combate, a guerra, e tantas outras palavras que vão contaminando e solidificando o sentimento e no inconsciente coletivo a certeza de que o inimigo a ser destruído é mesmo o favelado, sem meias palavras.

Se contê-los parece não surtir todo o efeito desejado, não há outro remédio senão o letal. Uma criança de três anos destruída por um tiro de fuzil, seja ele de que lado tenha vindo era para nos deixar perplexos, mas ante ato brutal nenhuma palavra sequer, fora as já bem estruturadas e bem formuladas no discurso oficial, sem contar a perversidade de dizer que se fora o outro lado, o crime que houvesse executado tal ato, não haveria passeatas e nem gritos por justiça.

Tal afirmação é de deixar alguém que tenha um pouco de humanidade,muito do que falta na gestão de nossas instituições, estarrecidos(as). Lembro de uma canção que diz que há no Brasil homens com tanto poder e nenhum coração.

É tão difícil ver materializadas a cada dia as palavras do atual secretário de segurança do estado, que afirmou sem nenhuma hesitação que um tiro na favela nunca será e terá o mesmo efeito do que um tiro na zona sul da cidade. As crianças da favela, como nas também precisas palavras do então ex-governador Sérgio Cabral, marginais em potencial, não são de fato, apesar de ser muito triste, algo que cause consternação ou comoção nacional.

Não veremos nenhum apresentador aos soluços lendo carta feita para despedida da criança, como vimos um apresentador da Record no caso Isabella Nardoni. Não veremos as criancinhas bonitas e bem tratadas, com seus versinhos e ursinhos em frente à casa do pequeno vitimado, até por ser uma área de risco, o que dificultaria qualquer ação, afinal, se trata do lugar do "mal", pois bem.

Não vão olhar os desenhos, os brinquedos, pois é, nem certidão Luiz Felipe tinha, então, não morreu ninguém, porque não como metáfora, mas como tragédia, ele nem existia para o ESTADO.

Nos contentemos e nos consolemos entre nós mesmo, que sabemos a dor que sentimos e a força da lágrima que derramamos.No filme onde um comediante faz o papel da sua mãe, antes retratada em peça teatral, uma cena mais tocante e parte da frase da personagem sobre a morte de um sobrinho é a seguinte: " quando um filho morre, todas as mães sentem".

É assim entre nós, sentimos todas a dor da mãe do Luiz Felipe. Para nós, a lágrima dela tem um significado enorme. Enquanto escrevo esta coluna, com o coração apertado, por tudo, pelas imagens que eu e algumas pessoas vimos ao sermos surpreendidas(os)por elas na rede social. No início fiquei com muita raiva de que tenham postado tal foto de Luiz Felipe destruído. E sei que a raiva é também porque eu não posso fazer nada, me sinto como se estivesse em um pesadelo e minha voz nunca fosse ouvida quando grito.

Eu grito e ela não sai do desejo de ser ouvida por alguém, que parta em meu socorro. Assim somos nós aqui no subterrâneo.

Enquanto escrevo, como dizia, ou melhor compartilhava em palavras nesta coluna a ação que coletivos organizados de diversas favelas, ativistas, militantes, pesquisadores, moradores de favela realizaram nesta segunda pelas ruas da zona sul e que serve como bálsamo nos tira do torpor, nesta segunda, ouço ao longe, vinda de uma birosca aqui no Borel a canção de Benito de Paula: "Eu era feliz, era a vida, minha espera acabou. Meu corpo cansado e eu mais velho.Meu sorriso sem graça chorou..."

É até aqui no lugar do "mal",nós também choramos. Aí percebemos que somos sim, pessoas,ufa!" A nossa luta é todo dia e toda hora. Favela é cidade.

Não à GENTRIFICAÇÃO ao RACISMO, ao RACISMO INSTITUCIONAL, ao VOTO OBRIGATÓRIO e à REMOÇÃO!"

*Texto de Mônica Francisco - Representante da Rede de Instituições do Borel.