HELIO FERNANDES -
Parece que não existe outro assunto. Esse processo que começou
estridente como mensalão e vai caminhando carinhosa, curiosa e
contraditoriamente como “Ação 470”, é realmente muito importante. Mas não a
ponto de ser tratado como fato único e intransferível. “Existem muito mais
coisas entre o céu e a terra do que imagina a nossa vã filosofia”.
Apesar do embalo (provocado) das condenações, das prisões, das
execuções, tudo isso está longe de ter chegado ao fim. E ainda estamos
distantes do fim verdadeiro. Mais longe das modificações colaterais, que
existirão, analisemos não o processo e sua quase conclusão (e também
premeditação) . E sim aquele que surgindo do nada, se transformou (por
premeditação?) no mais excepcional personagem individual destes 124 anos da República,
que não é a dos nossos sonhos.
O ESTRATEGISTA DE NOSSA SENHORA
Em vez de mensalão, Ação 470, o maior julgamento de corrupção da
História só deveria ter uma identificação: processo Joaquim Barbosa. Enquanto
era apenas relator, foi conduzindo a tramitação com a importância relativa do
cargo e os privilégios e superioridades que recebia. Mas com data marcada,
assumida e consolidada: a posse como presidente do Tribunal, acumulando com a
condição de relator.
Como os ministros (e todos os outros funcionários de qualquer
nível) aos 70 anos têm que sofrer o que se chama de “expulsória”, Ayres Brito,
presidente, tinha data para sair. E Joaquim Barbosa, vice, com a mesma data
para entrar, pois a presidência é exercida por rodízio. Essa data e essa
presidência-cumulativa, importantíssimas para Barbosa.
Não pela visibilidade que o exercício dos dois cargos
proporciona, mas por tudo o mais que é alavancado pela exposição em todo tipo
de mídia, a claridade que o holofote projeta sobre qualquer cidadão. Ainda mais,
um cidadão que, além de relator do mais volumoso processo da História, preside
e decide sobre o que ele mesmo relata. E pode comandar a estratégia capaz de
levá-lo e elevá-lo ao único cargo mais importante do que o do presidente do
Supremo Tribunal Federal.
JOAQUIM: O INVENTOR DE PALAVRAS
Assim que foi sorteado relator do mensalão (isso lá longe),
Joaquim Barbosa começou a ser identificado, mas não desvendado. Suas principais
referências ditatoriais começaram com a “invenção” (vá lá, popularização) de
palavras que existiam, mas eram desconhecidas e ignoradas pela não utilização.
O plenário (e a comunidade de favelados jurídicos) levou um
choque quando ouviu Joaquim Barbosa, sem consultar ninguém, dizer que o
processo seria F-A-T-I-A-D-O.
Foi motivo de gozação. Os outros ministros não perceberam que era um
golpe de mestre, como aconteceu no excelente filme com Paul Newman, com o mesmo
título. Demoraram a entender, Joaquim Barbosa já empolgara o país todo com a
popularização de outra palavra, retirada dos escombros do vernáculo: D-O-S-I-M-E-T-R-I-A.
(Até muitos sábios em Direito da Fundação Getulio Vargas, que
dominaram as análises quase sempre pretensiosas a respeito do processo, ficaram
desconcertados. Já estavam desconcertados em “ensinar” legitimidade, legalidade,
credibilidade, humanidade, e condenar irregularidade, trabalhando numa
instituição que carrega o nome do mais duradouro ditador individual da nossa
História.)
Ainda antes da presidência sem obstáculos e apenas com
objetivos, Barbosa fulminou a todos e mostrou suas intenções, com uma frase:
“Vou dividir o julgamento em sete itens, para facilitar”. Ninguém divergiu. A
impressão é que os ministros não tinham cacife, a não ser para concordar. E
concordaram, com as exceções previsíveis e confirmadas.
“GENIAL”: AS PRISÕES NUM 15 DE NOVEMBRO,
APROVEITANDO
O FERIADÃO DA REPÚBLICA
FOI
PARA O RIO, DOMICÍLIO ELEITORAL
BARBOSA,
PRESO AO 5 DE ABRIL DE 2014
SEM
INDECISÃO, SÓ DURAÇÃO
PS – Não é escolha ou opção, apenas destino. Antes dos 60 anos, terá desperdiçado o suposto futuro como presidente da República. Sem a presidência da República e sem o mensalão, restará apenas o ostracismo. E não saberá se é um ostracismo aberto ou semiaberto.
Como já deixei bem claro que só quero examinar o personagem
principal, seu futuro e a consequente ou inconsequente repercussão para o país,
essas decisões são mais importantes. E posso até chamar de “GENIAL” a
desumanidade de encaixar os condenados nesse 15 de novembro, que para efeito de
crueldade, durou 5 dias.
Começou no julgamento de quarta-feira passada, atravessou a
quinta, sexta, sábado e domingo, todos sabem que depois do feriadão, o país só
tem vida na segunda. E se essa ou essas vidas fossem colocadas em perigo,
afinal, nada é eterno, pode acontecer até mesmo a tão apregoada, desejada e
proveitosa R-E-N-O-V-O-L-U-Ç-Ã-O.
O próprio Joaquim Barbosa comunicou a ministros da sua maior
intimidade ou predileção: “Estou trabalhando intensamente, dia e noite, para a
execução das penas”. Nada disso, “menos” verdade de Sua Excelência. Era
facílimo decidir. Quem foi condenado de 4 a 8 anos, regime semiaberto. Passando
de 8, fechado. Menos de 4, domiciliar ou alternativo. Qual a dificuldade?
Falou também: “Tenho que examinar o que fazer com os condenados
que só tiveram dois votos e entraram com embargos infringentes”. Ora, Barbosa
se diz inflexível. Então, como o regimento interno do próprio Supremo é bem
claro, nenhum problema, a decisão é automática.
BARBOSA NÃO FICOU EM BRASÍLIA,
Na quinta-feira pela manhã, véspera do “feriadão”, o presidente
do Supremo veio para o Rio. Ele mora e trabalha em Brasília, mas vota e pode
ser votado, se for o caso, no Estado do Rio. Em Brasília, sua repercussão e
“presença” na mídia vista, lida e ouvida, estava garantida. Tratou de cuidar
que se estendesse até o Rio.
Andou por lugares nunca dantes navegados, passeou pelo famoso
Jardim de Alah, de “bermudão”, acenava para as pessoas, que retribuíam. Embora,
reconheçamos, muitos iniciavam o cumprimento. Andou em locais tidos como
populares, com um boné esportivo, só não teve coragem de usá-lo ao contrário,
como fazem os mais jovens.
Foi almoçar num clube dos mais reacionários e racistas do Rio,
sempre sozinho, não quer dividir o foco e a foto com ninguém. Não é sócio, não
deixaram que pagasse. É aquele clube que só permite a entrada de babás se
estiverem uniformizadas. Saiu satisfeitíssimo, jantou no restaurante mais caro
do país, teve que pagar, não se incomodou. Seus problemas não começam nem
terminam aí.
(Enquanto fazia turismo na
antiga capital, as irregularidades se acumulavam. Mesmo distante, sabia de
tudo, deixou que o Supremo fosse atingido. E os presos, também, pois foram
aprisionados mais duramente. Foi Barbosa que alavancou os protestos dos presos
e seus advogados. Nem falo de Genoino, operado há poucos meses, que está em
riscos graves. No Brasil não existe PENA PERPÉTUA. Joaquim, por conta própria,
instituiu a PENA DE MORTE. Na História do mundo, mortes suspeitas ou
inesperadas têm criado enormes problemas. Sem condenação ou absolvição, essas
ficam para os presos julgados: tudo o que está acontecendo, até a fuga do
Pizzolato, coloquem na conta de Joaquim.)
OS MENSALEIROS ESTÃO NA CADEIA.
Já disse, não quero examinar o mérito da Ação 470, que já foi
mensalão. Escrevi muito, examinei demoradamente, analisei profundamente. E
ainda sobrará bastante tempo. Nem a competência do Dr. Béja pode indicar ou
assinalar o fim de tudo isso. As coisas estão muito complicadas, cada um pode
expor suas ideias, menos prever ou adivinhar.
E essa incerteza pode facilitar qualquer conclusão, para um lado
ou para outro. Esclarecendo, sem provocação, comprovação ou contradição,
Joaquim Barbosa tem a oportunidade e a possibilidade de não terminar a carreira
como magistrado. Ou como Rui Barbosa definia o presidente do país: “É o
Primeiro Magistrado do Brasil”.
Não depende só dele. Precisa pertencer a um partido. Qual? Sua
atuação a partir do mensalão não permite dúvidas: ele é contra todos, mas tem
que ressalvar pelo menos um, para a filiação. E será convidado ou se convidará?
Impossível dizer.
Se precisar, tem o PSD à disposição. Quando Kassab afundou o
partido, explicou publicamente: “Não somos de esquerda, de centro ou da
direita”. Puxa, é o partido do Joaquim.
A OPÇÃO DE JOAQUIM,
A partir de agora, não levem em consideração qualquer coisa que
for afirmada ou negada, tem que ser confirmada. Isso leva tempo, de hoje ao
terceiro mês de 2014. As vantagens de uma candidatura presidencial de Joaquim,
muito grandes. Não falo nem calculo vitória, mas sim competição. Tudo leva à
confirmação da tentativa da mudança de endereço, de dia no Planalto, de noite
no Alvorada.
Se decidir disputar, tudo pode se realizar. Se não concorrer,
seu período na presidência do Supremo terminará em novembro de 2014, exatamente
com outra eleição ou até reeleição. Sem ele? Derrotado para presidente da
República, terá ainda um resquício de prestígio. Se passar a presidência a
Lewandowski, e com a relatoria terminada, restará o desperdício de um futuro
que poderia ser outro. Ele mesmo pensará assim.
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PS2 – Na certa, será um isolamento e um ostracismo fechado,
ninguém o verá. Existe segundo turno de OSTRACISMO?