Por TEREZA CRUVINEL - Via blog da autora -
O programa do PT exibido ontem expressa uma mudança importante na
relação do ex-presidente Lula e do próprio partido com o governo da
presidente Dilma Rousseff. Ao contrário de alguns palacianos, Lula não
acha que cometeu um erro ao participar do programa que só teve a
presença de dois quadros do partido, ele e Rui Falcão. Os outros eram
apresentadores. O risco de panelaços foi calculado mas prevaleceu a
prioridade: resgatar a imagem do PT junto a sua base histórica no
momento mais difícil da história do partido, quando se prega sua própria
extinção. Por isso o mote foi sempre "antes do PT", para falar do que
mudou nos últimos 12 anos, e não a defesa específica do atual governo.
Debilitada a tese do impeachment, Lula e o PT, mais que o governo
Dilma, tornaram-se alvos claros da investida que reúne partidos de
oposição, setores da mídia e do Ministério Público, em esforços
sucessivos para criminalizar o partido e imputar a Lula algum delito que
o torne inelegível em 2018. Exemplo da hora, a reportagem de capa da
revista Época desta semana, que foi demolidoramente contestada.
Neste ponto da luta política, Lula agora começou a trilhar um novo
caminho, em que agirá mais como o Lula histórico e menos como patrono do
governo Dilma. Ele não vai mais sugerir que Dilma faça isso ou aquilo,
ou tentar mediar conflitos na coalizão. Vai cada vez mais falar
diretamente ao povo, à base política do petismo, como no Primeiro de
Maio, quando disse esperar que Dilma vete partes do projeto de
terceirização que firam direitos. Até então, esperou que ela mesmo
anunciasse a disposição de veto e criticasse mais incisivamente o
projeto patrocinado pelo bloco conservador da Câmara liderado por
Eduardo Cunha. O programa irritou o PMDB por isso, e o governo por não
ter feito a defesa do ajuste.
Agora em suas falas, como ontem no programa, Lula vai explorar o
receio de retrocesso nas conquistas sociais, ainda forte nas camadas
mais pobres da população, apesar da rejeição elevadíssima a Dilma, ao PT
e ao próprio Lula nas camadas médias que batem panelas. Ao mesmo tempo,
continua conversando com setores do empresariado e das forças
produtivas e tocando sua agenda internacional através do Instituto Lula.
Participar do programa foi mais um passo nesta linha. O roteiro
tratou de recordar os avanços proporcionados pelo lulo-petismo e não foi
dirigido por João Santana, que preferia a defesa do atual governo, mas
por seu auxiliar Maurício Carvalho. Destacou as decisões já tomadas de
expulsar filiados envolvidos em corrupção daqui para frente (o que não
alcança os condenados da Ação Penal 470) e de não aceitar mais doações
de empresas, o que será muito difícil num país onde não há tradição de
doações de pessoas físicas. Mas no passado do PT era assim, lembra um
auxiliar do ex-presidente. E Lula manteve, em sua fala, a crítica pesada
que vem fazendo à terceirização ampla de mão-de-obra.
O partido e o Governo
Na tarde de ontem, quando a bancada da Câmara se reuniu para discutir
o apoio às duas MPs do ajuste fiscal, a distância entre partido e
governo também ficou clara para dois emissários de Dilma. O assessor
especial Gilles Azevedo disse na saída que não se sabia, no Palácio, que
havia um grau tão elevado de resistência da bancada ao projeto. O outro
foi o ministro Miguel Rossetto, que também deve ter se surpreendido com
as coisas que ouviu. O apoio da maioria foi tirado, mas sem fechamento
de questão, o que forçaria a punição dos seis deputados que se
declararam dispostos a votar contra a medida. Hoje o quadro mudou.
Irritado com o programa e a fala de Lula, o PMDB está exigindo que o
partido feche questão para votar a favor da MP. A bancada vai se reunir
no final da manhã e talvez ceda à pressão, mas liberando os deputados
contrários para não se ausentarem. Esta parece ser a única saída
possível.
Dilma continuará sendo apoiado por Lula e pelo PT, sobre os quais
pesaria também a derrocada de seu governo. Mas agora, as linhas de ação
estarão mais claras. Dilma deve estar compreendendo isso. Se até aqui a
posição do partido em relação ao ajuste foi ignorada, hoje ela acionou
ministros para dialogarem com o partido, apelando para que evitem uma
crise com a rejeição da MP, fundamental para o ajuste de Levy.



