Via Brasil de Fato -
Cresce o número de coletivos teatrais, o que vem popularizando o
teatro, ainda que esta nunca tenha sido uma arte de massas no Brasil.
A arte teatral é coletiva por definição. Ninguém faz
teatro sozinho, mesmo em monólogos existe sempre uma pequena equipe
auxiliando o ator. Em sua essência o teatro pressupõe o coletivo, já
que essa manifestação artística só ocorre quando um ator ocupa um
espaço e se relaciona com o espectador.
Para além
dessa proposição inicial, existe um teatro praticado Brasil afora
chamado de teatro de grupo, isto é, pessoas que se juntam para
expressarem seus desejos, angústias e críticas por meio da arte,
levando diversão, lazer e reflexão. Sem dúvida o que tem sido
produzido de mais interessante nos últimos 60 anos, sem exagero, vem
sendo realizado pelo teatro de grupo, e não só em nosso país. E é
possível afirmar que só cresce o número de coletivos teatrais, o que
vem popularizando o teatro, ainda que esta nunca tenha sido uma arte de
massas no Brasil.
Néstor García Canclini em seu livro Arte popular y sociedade em América Latina, traduzido por aqui como A socialização da arte,
afirma que o teatro, durante muitos séculos, foi uma arte popular e
apresenta algumas experiências que, mais que levar arte ao povo,
possibilita que se apropriem dos meios, das técnicas, para que eles
próprios façam teatro. Eis aí uma tarefa ainda atual e muitos são os
grupos preocupados em permitir não só o acesso ao teatro, mas que
também se preocupam em fornecer os meios para que mais pessoas possam
praticar essa arte. O jogo teatral faz parte do ser humano e pode ser
praticado e assistido por todos e todas, por isso foi utilizado durante a
Revolução Russa, em uma sociedade de maioria analfabeta.
Para
Canclini, “os grupos mais avançados são os que descobriram que a
formação teatral inclui, além da aprendizagem técnica, a análise das
condições socioeconômicas e comunicacionais do meio em que se procura
operar, suas necessidades básicas e os conflitos que impedem
satisfazê-las”. Esses elementos permitem saber qual teatro necessário
para cada realidade. Dialogar com o lugar, o particular, sabendo que
este reflete e refrata o universal.
Teatro é antes
de tudo comunicação, daí a importância dos procedimentos, vocabulários,
dentre outros. Muitos são os grupos que se apropriam de um vocabulário e
de técnicas populares, visando, justamente, se tornarem mais efetivos
em sua relação com o público. Dessa forma se colocam em outra disputa,
pois, ao se apropriarem dos “códigos populares”, passam, muita das
vezes, a sofrerem preconceitos, já que essas técnicas não são
reconhecidas pelos centros de produção de saberes. No entanto, muito são
os exemplos bem-sucedidos. O próprio Brecht se apropriou de técnicas
populares, assim como os Centros Populares de Cultura, o Teatro Popular
União e Olho Vivo – grupo mais antigo do Brasil, com 47 anos de
existência, tem como pressuposto básico as matrizes populares, como a
capoeira, o bumba meu boi e outros.
No Brasil,
muitos são os coletivos com mais de 30 anos, como o Tá na Rua (RJ), Oi
Nóis Aqui Travéiz (RS); dezenas os que têm mais de 20 anos, como o GPT
(AC), Pombas Urbanas (SP); centenas com mais de 10 anos, como Nu Escuro
(GO), Teatro de Caretas (CE) e outros tantos que nascem e morrem a cada
dia por diversos problemas. Entretanto, em geral, um grupo não morre,
ele se multiplica, pois teatro é junção e diáspora; quando um grupo se
acaba geralmente dois ou três surgem.
De qualquer
forma, é importante destacar que, apesar da produção hegemônica por
parte do teatro de grupo, a exceção do Programa de Fomento ao Teatro
para a Cidade de São Paulo, não existem políticas públicas de cultura
destinadas a essa forma de organização e de produção artística,
residindo aí uma das grandes dificuldades em se perpetuarem. Ainda
assim, os coletivos existem e resistem fazendo arte teatral nos mais
diversos rincões do Brasil, fazendo brotar flores no asfalto.
*Texto de Adailtom Alves Teixeira, graduado em História e mestre em Artes.