DANIEL
MAZOLA -
João Cláudio Pitillo, Pesquisador e Professor de História da UERJ e Antonio Jorge Couto, membro do Fórum Nacional dos Taxistas e sindicalista. |
O
fenômeno conhecido como uberização vem se
multiplicando cada vez mais nesse país de crises permanentes e do vale tudo
econômico e político. Para compreendermos a
uberização nossa reportagem conversou com dois especialistas no tema: o pesquisador
e professor de História da UERJ, João Cláudio Pitillo e com o membro do
Fórum Nacional dos Taxistas e dirigente sindical, Antonio Jorge
Couto, o Lampião.
Primeiro
é necessários entendermos que Uberização é um conceito usado para designar um
novo tipo de economia, perversa, no qual você tem pares oferecendo um serviço
ou um produto, uma relação de troca, mas, no meio, você tem um intermediário
extraindo valor dessas partes e não estabelecendo uma relação de trabalho
formal com elas. Segundo o Professor João Cláudio Pitillo, “os donos das
plataformas ou APPs detêm, em média, 25% a 30% do valor dos serviços prestados,
sem um contrato que assegure direitos trabalhistas. Através de um
marketing engenhoso, companhias bilionárias do Silicon Valley (EUA) apresentam
para seus consumidores uma imagem positiva e utópica que é extremamente
tentadora nestes tempos econômicos tenebrosos”.
O
Uber diz que faz parte de um novo fenômeno, o da “economia compartilhada”—
termo que conjura a imagem de pessoas alegres e bem-dispostas ajudando umas às
outras, todas ganhando uma parcela justa no processo. Mas a ideia de que o Uber
se enquadra nesse conceito de “economia compartilhada” é desonesta, pois o
aplicativo nada mais é do que uma empresa extremamente agressiva tentando de
tudo para maximizar seus lucros. “No Rio de Janeiro o Uber começou a
operar fortemente a partir da Copa do Mundo em 2014. A ideia do negócio surgiu
via uma empresa de alta tecnologia e acredita-se que exista participação da NSA
(Agência de Segurança dos EUA). O Uber alega ser apenas uma empresa de TI que
facilita a vida das pessoas, ligando um ponto a outro, mas na verdade operam um
meganegócio na área de transportes. O Tribunal europeu recentemente reconheceu
que eles exercem uma atividade de transporte. É importante destacar o que está
por trás disso: o interesse de mapear os hábitos econômicos e comportamento das
pessoas, assim depois eles podem vender pacotes de informações para projetos
comerciais de fidelização dos clientes. O Uber tem acesso aos dados dos cartões
de créditos”, explica o pesquisador João Cláudio Pitillo.
A
economia digital hoje é o novo campo da flexibilização do trabalho, leia-se
precarização. Olhando apenas para o Brasil: motoristas, motofretistas,
caminhoneiros, esteticistas, operários da construção civil, trabalhadores do
setor de limpeza, babás, assim como advogados, médicos, professores, entre
outros, contam com aplicativos que possibilitam a uberização de seu trabalho. O
mercado de trabalho em geral agora é permeado por um espaço virtual de compra e
venda de trabalho, conhecido como marketplace. Trata-se de um universo virtual
extremamente propício para a transformação de trabalhadores em
microemprendedores, assim como de trabalhadores em trabalhadores amadores.
“No
Brasil o Uber foi favorecido pelo ambiente de golpe de estado em 2014, chegaram
desrespeitando nossas leis. Nesse contexto, o que de mais grave conseguimos
identificar é a questão da precarização da mão de obra. As empresas de
aplicativos piratas como Uber não tem ativos nenhum no mercado formal, não
contratam mínguem, e numa economia fragilizada como a nossa eles estão
aproveitando e ampliando os lucros. Existem várias leis que proíbem isso aqui
no Brasil, mas nosso judiciário ao invés de aplicar a lei passou a
interpreta-la, fazendo com que os taxistas fiquem desamparados. Agora qualquer
um que precise complementar sua renda, ou esteja desempregado, está liberado
para usar um automóvel e atuar na área de transportes. Esse indivíduo que
precisa sobreviver via Uber na selva do capitalismo, está no centro de uma
tragédia chamada ‘mão de obra precarizada’. Além disso, esse modelo só trás
mais atrasos e transtornos, levando mais automóveis e engarrafamentos para as
vias, aumenta a poluição, diminui a mobilidade urbana, e aumentando o número de
acidentes. É obvio que transporte público não pode ser feito em carro
particular”, frisa João Cláudio Pitillo.
Didaticamente,
Antonio Jorge, taxista profissional há 33 anos, sindicalista e membro do Fórum Nacional dos
Taxistas, explicou: “não tem outra forma de garantir a sobrevivência, o
trabalhador é obrigado a trabalhar para empresários (capitalistas), ou por
conta própria. As empresas que organizam a produção e põem seus produtos
no mercado são propriedades privadas no sistema capitalista. Existem 110
mil carros particulares rodando na cidade do Rio de Janeiro através de
aplicativos tipo Uber, estão todos ilegais. Essas pessoas não são monitoradas,
treinadas e não pagam impostos. Por isso, temos tantos casos de acidentes e até
estupros envolvendo esses motoristas. Muitos desses carros estão com busca e
apreensão, sem passar pela vistoria obrigatória. As milícias têm
migrado em grande número para mais essa categoria ilegal de transportes. O
rendimento dos taxistas caiu em média 50%. Muitos taxistas não vão mais trocar
seus carros, e a frota vai envelhecer, isso é péssimo para os usuários, vai
cair em qualidade e segurança”.
Entre
as muitas ilegalidades do Uber, vale destacar que a legislação não autoriza a
iniciativa privada a taxar preços ou tarifas, isso é de exclusividade do setor
público. Antonio Jorge também afirmou que, “Igrejas estão incentivando
fieis desempregados a trabalhar com Uber como alternativa, assim podem
sobreviver e levar o dízimo. Diversos países do mundo, principalmente europeus,
estão banindo esse modelo Uber. Aqui no Rio de Janeiro o processo
de Uberização veio na esteira do PMDB em 2014, o deputado e filho do
ex-governador Sergio Cabral, quando veio de uma de suas viagens a Nova York
falou que o Uber era uma maravilha e que deveria ser implantado por aqui.
Tristeza e tragédia!”.
O
fato é que em meio a tantas mudanças sucessivas e permanentes crises do
capitalismo, que ocorrem em ritmo cada vez mais acelerado, o trabalhador,
como não poderia deixar de ser, vem pagando o pato. E com as novas mudanças
anti-trabalhador, denominada "reforma trabalhista", passaremos a
viver um capitalismo sem direito do trabalho, com mais terceirizações e uberização.
Precisamos
enfrentar isso, ou seremos todos escravizados novamente. Aceitar ou rebelar-se,
simples assim!