8.9.16

GRACIAS A TEMER!

MARCELO MÁRIO DE MELO - 


Agradeço a Temer, porque tinha programado a minha festa funeral para os 102 anos, mas diante da sua assunção ao poder e a meirelização da economia nacional, programada para pelo menos vinte anos, mediante emendas à Constituição de 1988, aflorou a idéia de ampliar também meu prazo de vida por mais vinte, indo até os 122. Como decorrência, parti para cuidar ao máximo da saúde, a fim de chegar lá nas melhores condições possíveis. Agradeço a Temer, também, por isto. 

Agradeço a Temer, porque ele, insistindo no mofado slogan Ordem e Progresso, que malversa a nossa bandeira nacional, me fez retirar do baú de algumas décadas a bandeira brasileira com o slogan Justiça e Liberdade, em sintonia com o espírito democrático-popular que moderadamente bafejou a Constituição de 1988.

Agradeço a Temer porque ele, no seu primeiro pronunciamento de interino, levantando hipóteses sobre o seu governo, afirmou: “se houver erros, concerta-los-ei!”, numa restauração arqueológica da mesóclise, caracterizando no nosso céu de anil a metáfora de um governo mesoclítico.

Agradeço a Temer, porque, com esse arroubo gramático-pré-histórico, ele também me fez tirar do baú dos anos 1980, o personagem Di-lo-ão, O Gramático, síntese do conservadorismo linguístico agora se espraiando nas saletas da política.

Agradeço a Temer porque ele, com profunda capacidade de convencimento, conseguiu demonstrar, irrefutavelmente, a petistas, esquerdistas e governistas iludidos com falsas alianças, que ocupar o governo não é tomar o poder, e que base aliada não é a mesma coisa que base alinhada.

Agradeço a Temer por afrontar e desafiar a capacidade de resposta do proletariado, dos pobres e lascados de vida, da classe média de cinto apertado, dos pequenos e médios proprietários e empreendedores, provando-lhes a verdade irrefutável de que as formas de mobilização de cúpula, as meras mobilizações de militante, as articulações puramente eleitorais, sem irradiação nas bases da sociedade, não têm força para deter o rolo compressor da classe dominante, de quem ele agora é timoneiro.

Agradeço a Temer que, escrevendo certo por linhas tortas, deixou claro, muito claro, que opostos não são supostos.

Agradeço a Temer, porque ele, vestindo o figurino cinzento do Governo Dutra, trás à memória as estocadas satíricas do comunista-humorista Aparycio Torelly, o Barão de Itararé, revigorando o humor nos apesares.

Agradeço a Temer, que alimenta a seara do humor nacional, pois em cada conjuntura ruim, sempre se faz uma piada melhor.

Agradeço a Temer por estimular a resistência democrática a beber de novo na fonte da poesia de Carlos Drummond de Andrade, que indicava nos anos 40 do século passado:

“O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas”.