22.12.13

É NATAL, A CELEBRAÇÃO DO CONSUMO!

DANIEL MAZOLA -

A celebração do Natal, que deveria consagrar a união amorosa dos indivíduos, serve, antes, para a separação dos mesmos, mediante a distinção social promovida pelo poder de consumo. Karl Marx ensinou que o fetichismo da mercadoria consiste no ocultamento da relação social que passa a ser mediada pelas mercadorias, e não mais entre seus produtores e indivíduos. 

Nos dias atuais, todos os valores religiosos, sagrados e dogmáticos do Natal são profanados pela ideologia capitalista, e as artimanhas publicitárias capitaneadas pela sociedade de consumo transformaram a celebração natalina em um evento dissociado de seu objetivo primordial. A prova de amor entre os entes queridos consiste em se dar presentes caros. De acordo com cientistas sociais e pesquisadores “a publicidade recupera todos os valores para melhor desvalorizá-los e difundir sua ideologia consumista. É uma poluição pluridimensional, que não tem outra finalidade se não estimular o consumo dos produtos do sistema industrial, isto é, da matriz de todas as poluições. Nesse sentido, a publicidade é a poluição das poluições”.

A sociedade capitalista é baseada nos signos de consumo, sucesso pessoal e promessas de felicidade mediante a satisfação do gozo. As relações pessoais estão longe de serem calcadas somente na afetividade. Vive-se a era em que o status e os signos das marcas são combustíveis para a aquisição de um pretenso bem-estar existencial. A felicidade interior evadiu-se na sociedade de consumo, poucos são capazes de vivenciá-la plenamente no cotidiano, muitos consideram que o bem-estar efêmero decorrente da fruição dos bens de consumo é a autêntica felicidade, de modo que criam, assim, uma confusão fundamental entre as duas experiências. Conforme a perspicaz análise de Erich Fromm (1900-1980), “a felicidade do homem moderno consiste na emoção de olhar vitrines e comprar tudo o que lhe é possível, à vista ou a prazo”.

A partir do desenvolvimento do regime capitalista, as relações interpessoais passam a ser mediadas pelas coisas, ou seja, quem nada tem nada é; decorre daí todas as distinções sociais provenientes da exaltação das posses materiais. Passamos a projetar nos objetos qualidades fantasmagóricas que interferem imediatamente nas relações sociais, interpondo-se entre os indivíduos, originando-se daí o fenômeno denominado por Karl Marx (1818-1883) como “fetichismo da mercadoria”.

Os objetos adquirem qualidades mágicas que encantam os sentidos dos consumidores, e todas as relações sociais são mediadas por objetos de consumo, que se tornam barreiras entre as subjetividades. Assim, o caráter alienado de um mundo em que as coisas se movem como pessoas, e as pessoas são dominadas pelas coisas que elas próprias criam. A consciência humana projeta para o produto uma espécie de energia oculta que se torna seu objeto de culto sagrado, celebrado nos altares capitalistas das vitrines das lojas.

Consumo: felicidade e angústia

A sociedade de consumo em sua falência ética considera que a morte de um cidadão é menos importante que as vitrines de uma loja atacada pelo clamor popular, e empresários cínicos fazem patéticos rituais fúnebres para os produtos destruídos pela ação revolucionária das multidões, mas sequer se preocupam com as condições de vida dos miseráveis deserdados cotidianamente pelo Estado plutocrático, capitalista. Esse mesmo empresário que condena a luta popular contra a opressão pelo fato de tal revolta prejudicar os seus interesses pecuniários é o mesmo sujeito que oprime o trabalhador impondo-lhe jornadas de trabalho exaustivas em nome do cumprimento de índices de venda exorbitantes, pagando-lhe uma miséria por sua labuta.

Os critérios “morais” da sociedade consumista, herdeira do tecnicismo industrial, consistem na obrigação incondicional do indivíduo se apresentar publicamente como alguém plenamente capacitado a consumir, mesmo que tal ato não resulte na satisfação de uma necessidade básica, imprescindível para o estabelecimento do bem-estar e saúde individual. A lógica consumista faz da disposição de adquirir coisas uma necessidade vital, e o sistema espetacular da propaganda contribui de forma colossal para tal relação fetichista.

O Papai Noel não vem pra todos, apesar da falácia publicitária. Inúmeras crianças são frustradas pelo fato de não obterem os presentes tão desejados. Muitos pais se sentem humilhados e constrangidos por não conseguirem comprar os presentes dos seus filhos. Sendo assim, são consumidores falhos que não cumpriram as metas normativas do capitalismo natalino.

O amor sagrado sucumbiu diante do poder diabólico das mercadorias encantadas. Feliz Natal!?