HÉLIO DUQUE -
Impedir a chegada de novas gerações ao poder e consolidar o clientelismo patrimonialista e oligárquico, após a redemocratização, vem sendo a grande agenda da política brasileira. Mudam a lei eleitoral com frequência garantindo o continuísmo, desestimulando novos nomes que possam renovar os partidos políticos. A criação, em tempos recentes, do Fundo Eleitoral e do Fundo Partidário é um exemplo. Nesse ano abocanharam aproximadamente 2,6 bilhões de reais para as agremiações partidárias. Ressalte-se que, no passado recente, essas entidades privadas (os partidos políticos) não contavam com o dinheiro público. Passamos a viver o tempo da “partitocracia” que na imensa maioria não representa os interesses nacionais, mas unicamente os interesses pessoais e oligárquicos. Consolida a profissionalização da atividade política em todos os níveis. No futebol vende-se o passe do jogador, agora surgiu o mercado da compra de deputados. Para mudar de partido o valor varia de R$ 1 milhão a R$ 2,5 milhões. Tudo bancado pelo Fundo Eleitoral.
Quando relator da sepultada reforma política na Câmara, o deputado Vicente Cândido produziu uma frase lapidar: “A única coisa que unifica o Congresso é a vontade de se reeleger”. O agora descaracterizado MDB (no passado com sólida história de redemocratização), presidido pelo senador Romero Jucá (no passado defensor dos governos autoritários), na última reunião da executiva nacional ao ter o seu mandado prorrogado por mais um ano, oficializou os privilégios das oligarquias partidárias.
Cada um dos 59 atuais deputados federais da legenda receberá R$ 1,5 milhão e os 14 senadores ganharão para as suas reeleições R$ 2 milhões, totalizando R$ 116 milhões. A “bonificação partidária” será unicamente para os detentores de mandato. Os candidatos novos não contarão com ajuda financeira. Nos demais partidos e arremedos de partidos que operam no mercado de legendas não deverá ser diferente.
Aqui vai, por dever histórico, um testemunho pessoal: exerci por três mandatos a missão de deputado federal, na quarta eleição não disputei. Fui um dos vice-presidentes da executiva nacional do PMDB e nunca recebi um centavo para as minhas campanhas. Igualmente Ulysses Guimarães que era o presidente nacional do partido. Não existia o Fundo Eleitoral. A deformação eleitoral foi a partir de 1997 quando, por emenda constitucional, o governo de Fernando Henrique Cardoso teve aprovada a reeleição para os cargos executivos. A Constituição de 1988, ao vetar a reeleição agia com prudência e equilíbrio, impedindo que o “mercado persa” eleitoral fosse tônica na política brasileira.
Em 2016, o deputado federal Carlos Najar apresentou projeto de lei acabando com a reeleição para o poder executivo. E limitava a três mandatos consecutivos no mesmo cargo no poder legislativo da União, dos Estados e Municípios. Proposta parlamentar amparada em sólido fundamento democrático. Nos EUA, em 17 Estados, as Constituições estaduais limitam ao mínimo de 2 e o máximo de 4 mandatos para deputados e senadores estaduais. A advogada Olívia da Silva Telles, graduada na Faculdade de Direito da USP e pós-graduada pela Universidade de Partis é autora do livro “Direito Eleitoral Comparado – EUA, França e Brasil”. Nele se constata o atraso político brasileiro em relação à representação popular. Em função disso o projeto de lei do deputado federal Carlos Najar foi remetido para o arquivamento.
No México, o artigo 59 da Constituição estabelece: “Los senadores y diputados al Congreso de la Unión no podrán ser reelectos para el periodo inmediato”. Longe de defender a legislação mexicana que é radical, mas sem uma verdadeira reforma política o Brasil continuará a ter no caciquismo, no populismo, a sua militância política parlamentar divorciada dos interesses públicos.
* Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira.