Via Correio do Brasil -
O dinheiro depositado em paraísos fiscais circulam o mundo em questão de segundos, sem pagar impostos |
Um estudo da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado nesta quarta-feira, estima que entre 8% e 15% da riqueza
financeira líquida mundial estejam em paraísos fiscais, a maior parte
sem registro, o que gera perda de recursos públicos de US$ 190 bilhões a
US$ 290 bilhões por ano. Os dados fazem parte do Relatório de Comércio e
Desenvolvimento 2014 – publicação anual da Conferência das Nações
Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad).
“Entre US$ 66 bilhões e US$ 84 bilhões são perdidos por países em
desenvolvimento, o que equivale a dois terços do valor anual da Ajuda
Pública ao Desenvolvimento”, destaca o texto.
O documento critica a queda das tarifas comerciais ao reduzir muito a
arrecadação de impostos sobre o comércio exterior, bem como a maior
mobilidade do capital e o uso intensivo de paraísos fiscais. Segundo o
relatório, isso tem alterado as condições para a tributação sobre a
renda e a riqueza. “Os acordos de governança que evoluíram na era
da globalização liderada pelas finanças deram liberdade demais às
empresas privadas e reduziram demais o espaço para a ação do governo.”
O relatório defende que para regular as finanças domésticas é
necessário que os mercados financeiros internacionais também sejam
regulamentados. Para isso, é preciso conceder papel mais proeminente
para instituições como o Comitê de Especialistas em Cooperação
Internacional em Matéria Fiscal das Nações Unidas e adotar uma convenção
internacional contra a fraude e a evasão fiscais. “A concorrência
fiscal entre países, para atrair ou reter investidores estrangeiros,
acaba por provocar um nivelamento fiscal por baixo.”
Em relação às empresas, o principal veículo de evasão fiscal ou de
evasão e fuga de capitais dos países em desenvolvimento é o uso indevido
de “preços de transferência” – quando as empresas internacionais
definem preços para bens e serviços fornecidos a diferentes partes de
sua rede de forma a gerar lucros ou perdas que minimizem o pagamento de
impostos. A estimativa da Unctad é que os países em desenvolvimento
estejam perdendo mais de R$ 160 bilhões de dólares por ano, valor bem
superior ao da soma dos orçamentos de ajuda dos países desenvolvidos.
A Unctad observa ainda que a arquitetura fiscal internacional não se adaptou
adequadamente a essa realidade. “Os centros financeiros offshore e as
jurisdições sigilosas que os hospedam estão totalmente integrados ao
sistema financeiro global e a quantidade significativa de fluxos
comerciais e de capital é canalizada por meio deles. O uso dessas
jurisdições hoje faz parte da prática empresarial ‘normal’ na maior
parte das grandes empresas e bancos.”
Mobilizar a receita fiscal nacional é fundamental, de acordo com o
relatório, que reconhece os esforços recentes destinados a melhorar a
transparência e o intercâmbio de informações sobre questões fiscais. O
alerta, entretanto, é sobre o fato de que tais iniciativas são, na
maioria, lideradas pelas economias desenvolvidas – algumas das quais
abrigam jurisdições sigilosas e poderosas corporações transnacionais.
Com isso, o texto constata que governos de países ricos e pobres
precisam ampliar os gastos públicos em infraestrutura, serviços básicos e
transferências sociais, além de financiar investimentos, para reverter o
atual quadro econômico de lento crescimento. “Com níveis mais elevados
de renda média, surgem uma base tributária mais ampla e fontes mais
confiáveis de arrecadação por parte do Estado”, informa o relatório. “A
atual estrutura da economia global está dificultando a expansão das
receitas”, acrescenta.
Para evitar o risco de uma queda acentuada do crescimento, o
documento orienta que os países em desenvolvimento deem menos ênfase às
exportações aos países desenvolvidos e mais destaque às demandas
doméstica e regional