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Operárias da fábrica da Duloren quebram o silêncio de 20 anos e falam sobre as difíceis condições de trabalho. |
Quem vê as belas roupas íntimas da famosa marca Duloren, não imagina
as condições de trabalho a que são submetidas as operárias de sua mais
importante fábrica, localizada em Vigário Geral, no Rio de
Janeiro.Humilhação, más condições de trabalho, baixos salários, excesso
de trabalho e perseguição.
Essas são algumas das queixas das mais
de 3 mil costureiras que trabalham no edifício de 6 pisos, da principal
linha de produção da Duloren. “Costuro aqui há 29 anos e nos últimos
anos só perdemos benefícios. Há 10 anos, nosso salário era igual ao dos
motoristas de ônibus. Hoje eles ganham R$ 1.950 e nós R$ 835”, conta
Adriana, de 56 anos.
As trabalhadoras que recebem 100 reais de
cesta básica, além de considerarem a quantia insuficiente, alegam que o
chefe faz de tudo para eliminar o benefício. “Em caso de doença, se a
gente pegar atestado por mais de três dias, perdemos o direito à cesta
básica”, relata a costureira Silvana, de 38 anos, que trabalha há 4
anos, na empresa.
Outras denúncias são o excesso de trabalho e a
dificuldade em receber a comissão sobre as peças produzidas. “Nós
trabalhamos com meta de produção estabelecida pelo patrão e ganhamos um
bônus de 150 reais mensal. Por exemplo: tenho que produzir todos os dias
40 lotes de roupa. Posso bater a meta durante 29 dias, mas se no último
dia do mês não atingir essa marca, perco tudo, ou seja, basta um dia
para não receber o bônus de produção, que já é muito baixo”, desabafa
Carla, de 32 anos.
Ela foi uma das 2 mil operárias que
participaram nos dias 13 e 14 de maio de uma greve, a qual, pela
primeira em 20 anos, paralisou a produção de uma das maiores marcas de
lingerie do Brasil.“Estamos cansadas de tanta humilhação, perseguição e
punição por qualquer coisa. É comum encontrar meninas chorando no
banheiro. Trabalhamos em um clima de terror e algumas não aguentam a
pressão. Isso quando podemos ir ao banheiro, porque com esse ritmo de
trabalho não dá tempo nem de tomar água.
Mas depois da paralisação
que fizemos, o patrão começou a respeitar melhor a gente”, destaca
Marcela, de 35 anos. “A gota d’água que motivou a greve foi a humilhação
sofrida por uma colega, proibida de entrar com sua bolsa transparente,
onde levava seus pertences e um pão para tomar café da manhã”, conta
Adriana.
Trabalhadoras também pedem aumento salarial de 20%
As
trabalhadoras têm suas bolsas revistadas na entrada e na saída da
fábrica, o que é proibido por lei. Em algumas linhas de produção, elas
relatam inclusive a revista íntima. “No setor onde trabalho temos que
colocar e retirar o uniforme na frente da segurança. Ela fica no
vestiário observando a gente”, revela Josiane, de 40 anos.
A
coordenadora geral da Casa da Mulher Trabalhadora, Eleutéria Amora da
Silva, afirma que “a revista íntima disfarçada é uma prática comum nas
fábricas de roupas. Temos recebido muitas denúncias, só esse ano foram
cinco de operárias da Duloren”, ressalta. “Além disso, muitas
costureiras da Duloren estão ficando doente, devido aos excessos e às
péssimas condições de trabalho”, frisa.
Uma das conquistas da
greve foi o fato de poder entrar com bolsinhas transparentes. Outras
reivindicações, como aumento salarial de 20% e melhores condições de
trabalho ainda estão sendo negociadas com o dono da fábrica, o
empresário Roni Argalji. A Duloren foi procurada pela reportagem, mas
até o final da edição não tinha respondido as críticas feitas pelas
operárias.
*Os nomes das trabalhadoras citadas nesta reportagem são fictícios, pois temem represália.