9.7.19

CONSELHO

MIRANDA SÁ -

“Se você é capaz de distinguir entre o bom e o mau conselho, então não precisa de conselho” (Edward Murphy)


Quando deixei de ser menino, mas ainda não me tornara adulto, ouvi uma lição que trago até hoje nos ouvidos: “Se conselho fosse bom não seria gratuito, cobrar-se-ia muito caro por ele”… Poucos da minha geração seguiram este ensinamento, ouvindo-os e distribuindo-os com outros…

Talvez estivessem certos. É inconveniente pedir conselhos, mas deve-se recebe-los com agrado, e sendo bons, passa-los adiante para quem encontre utilidade neles.

No meu caso, guardo com carinho o valor das palavras que ilustram os pensamentos, elas são os instrumentos adequados para garimpar sabedoria. Aprendi com o grande Confúcio: “Eu não procuro saber das respostas, procuro compreender as perguntas. ” As palavras, escritas ou faladas são moedas de troca das experiências.

Perguntar é uma obrigação de quem quer aprender. Lembro uma história antiga que ouvi, mas não sei se expressa uma passagem histórica ou uma lenda; como é elucidativa, memorizei-a e registro-a em linguagem corrente. Ei-la:

“Na primeira vez em que foi convidado a falar num comício, Alcebíades, o grande orador e político da antiguidade grega, sofreu um medo danado de enfrentar o auditório. Sentiu aquilo que a gíria teatral chama “trac”, a vacilação em enfrentar o público. O seu tio Péricles mandou-o procurar o conselho de Sócrates, o sábio.

Expressando ao Mestre o que ocorria, Alcebíades ouviu dele: – “Acaso te acanharias em falar cara a cara com o feirante Ariston? ” – “Não”, respondeu o jovem.

“O filósofo insistiu: – “Terias medo de conversar cara a cara com o sapateiro Leandro? ” – “Evidente que não! ”, enfatizou o político principiante.

“Sócrates então resumiu o seu julgamento sobre a multidão: – “Nesse caso, o que pode te causar preocupação a ideia de vê-los ambos multiplicados por cem ou por mil? ”

Esta tirada filosófica substituiu o “Conselho” o substantivo masculino originário do latim, (concilium, ii) com significado de associação, reunião, assembleia, concílio. A palavra vulgarizada passou também a ser pessoa que dá conselhos; quem aconselha, orienta, dá direcionamentos a outrem; aconselhador, guia.

Conselho pode ser um aviso, um parecer ou um grupo de pessoas com funções deliberativas, como “conselho de família”, “conselho de ministros” ou “conselho de guerra”. Parece estranho, mas estão corretos os verbetes conselho (com “s”) e concelho (com “c”) na língua portuguesa.

Esta troca-letras é corriqueira e frequente na gramática e usual na advocacia, na magistratura e no parlamento. Registra-se com ela a vitória do ministro Sérgio Moro sobre os jornalistas comprometidos em criticá-lo e metidos a conhecer a língua lusófona. Participando de uma audiência pública no Congresso, Moro usou a palavra “Conge” sendo criticado pela mídia como se tivesse cometido um erro.

Esse exemplo mais do que perfeito da crítica ignorante teve efeito entre os ignorantes lulopetistas ávidos em apontar erros do juiz da Lava Jato, mas não entre os estudiosos do idioma…. Agentes midiáticos não pesquisaram o novo acordo ortográfico, nem estudaram a redução de sílabas átonas na linguagem coloquial.

Para o respeitado gramático, doutor Ernani Terra, a palavra “Conjugue” na terminologia jurídica, tem como raiz “jugo”, trazendo em si o conceito de vínculo matrimonial. Deslizou na linguagem comum para “Conge”. Terra, ironicamente, apela para outro jargão advocatício, o “benefício da dúvida”, que deveria ser dado a Moro…

Na minha opinião, como Sérgio Moro é Sérgio Moro, caber-lhe-á até o direito de criar neologismos… por isso, o Dicionário informal sempre presente no Google, apressou-se a registrar o verbete como variação falada de “conjugue”, referindo-se à pessoa com quem se mantém relacionamento matrimonial.

Para os cretinos que atacam Moro para defender o arquicorrupto Lula da Silva, preso por corrupção e lavagem de dinheiro, deixo-lhes Machado de Assis: “Ouçam-me este conselho: em política, não se perdoa nem se esquece nada”.