JEFERSON MIOLA -
Em junho passado, por ocasião de evento promovido pelo TSE com a União Européia para discutir o combate a notícias falsas [fake news], o então presidente Luiz Fux declarou que “se o resultado de uma eleição qualquer for fruto de uma fake news difundida de forma massiva e influente no resultado, o artigo 222 [do Código Eleitoral] prevê inclusive a anulação”.
Passados 4 meses daquele evento, constata-se que a eleição está infestada por uma massa gigantesca de fake news e conteúdos falsos industrialmente produzidos pela campanha do Bolsonaro, como parte da guerra cibernética que ele promove contra a candidatura Haddad/Manuela.
A 10 dias da eleição, o TSE confessa-se totalmente despreparado e desequipado para enfrentar a torrente de fake news propagadas a partir de sistemas de telecomunicações de países estrangeiros e que inundam a eleição e que, a essas alturas, alcançam magnitude incalculável.
A inaptidão do TSE é confirmada pelas opiniões do vice-procurador-geral eleitoral Humberto Jacques de Medeiros, resumidas do seguinte modo na reportagem da FSP de hoje: “Não há como monitorar mensagens enviadas pelo aplicativo WhatsApp, que preza pela privacidade, nem aplicar a ele a mesma metodologia de combate às fake news empregada em redes sociais como Facebook e Twitter. O problema das notícias falsas é menor do que parece, e 90% das conversas no WhatsApp são interpessoais, e não por meio de grupos”.
O vice-procurador-geral – por ignorância, partidarismo ou por incúria – ainda minimiza o problema, dizendo que “o volume de informações mentirosas não tem esse número alarmante”.
Essas declarações peremptórias contrariam, contudo, a constatação de integrantes do conselho consultivo do próprio TSE, que identificaram que depois do primeiro turno, “o Whatsapp é um dos principais meios de transmissão de notícias falsas” [sic].
Medeiros se contradiz feio. Ao mesmo tempo em que invoca o sigilo e a privacidade que, teoricamente, impediria o exame e o conhecimento dos conteúdos espalhados, ele declara que as informações mentirosas não têm “esse número alarmante” [sic].
Ora, o vice-procurador-geral somente consegue aferir a magnitude e o tipo de informações porque consegue ter acesso ao conteúdo do Whatsapp.
O vice-procurador-geral do tribunal diz ainda que “90% do tráfego de WhatsApp no Brasil é interpessoal. Não é essa megalópole de grupos que as pessoas tendem a imaginar” – o que é profundamente equivocado, porque os grupos funcionam como uma tipologia organizativa e relacional bastante observada nos intercâmbios interpessoais nesta mídia.
O trabalho investigativo de hackers brasileiros e estrangeiros do coletivo Hackers pela Democracia, que acompanha o tráfego de conteúdos na campanha eleitoral, chegou às seguintes constatações preliminares:
1- a campanha do Bolsonaro usa plataformas e infra-estruturas logísticas instaladas em países estrangeiros, de onde são feitos bombardeios nas redes sociais e mídias digitais;
2- ainda é impreciso saber a magnitude da constelação de grupos de Whatsapp, porém sabe-se que sua arquitetura de funcionamento alcança dezenas de milhões de eleitores;
3- quase metade [49%] dos conteúdos são enviados através de áudios, vídeos e memes, e não por intermédio de textos [48%];
4- é possível correlacionar o crescimento da rejeição do Haddad nas pesquisas com os ataques no Whataspp, que manipulam e estimulam o ódio, o racismo, o preconceito e o antipetismo.
A situação é gravíssima. Está evidente que os supostos preparativos feitos pelo ex-presidente do TSE para assegurar a lisura do pleito e o respeito da soberania popular não produziram a eficácia necessária, fato que justifica a desconfiança de que a atuação do tribunal não passa de fake news.
É alarmante: o TSE não está preparado para combater a indústria de fake news do Bolsonaro e, menos ainda, para enfrentar a guerra cibernética contra Haddad e Manuela.
A manipulação do Whatsapp produz efeitos assombrosos, devido ao tremendo alcance desta mídia no Brasil, que tem cerca de 120 milhões de usuários – 10% do total de usuários de todo o mundo.
A lisura da eleição está ameaçada pela guerra cibernética que visa destruir Haddad para instalar um regime ditatorial e de terror político e social propício à consecução do projeto ultraliberal anti-povo, anti-nação e anti-democracia.