6.1.17

POESIAS: MEIO A MEIO; BITOLA LARGA; REALISMO AZEDO; CARGAS DO AMOR

MARCELO MARIO DE MELO -




MEIO A MEIO
A água da tristeza
vai engrossando
faz-se gosma
vira pedra empoçada
no fundo da alma
lago mais raso
metade agua
metade pedra
aguavida
pedrador.

É vamos nos acostumando
a seguir assim
no meio a meio
à meia voz
à meia luz
à meia vida.

***

BITOLA LARGA
A tristeza mortal medrou sem me medir
e me jogou num caixão de gigante
com excesso de sobra por todos os lados.
Bati na porta fechada
reclamando da desproporção
e recebi a resposta
do coveiro:
“aqui se opera
com largueza e abundância
em releitura de Procusto.
Trate de aumentar sua tristeza
até os limites do caixão
e boa sorte em grande morte”

***

REALISMO AZEDO
Abri o ziper do sorriso na vitrine
mordendo lágrimas pedradas
as mãos fechadas nos bolsos furados
por onde caíram
as últimas moedinhas da esperança.
Os pés arrastam o corpo na esquina
onde um vira-lata
tenta morder meu calcanhar
e o mendigo estende a mão
pedindo qualquer coisinha de sonho.
Dou-lhe uma rosa murcha
uma caixa de fósforos molhados
uma carta de amor devolvida
e uma promessa
fora do prazo de validade.

***

CARGAS DO AMOR
Hoje acordei mais leve
sem as cargas do amor
nas minhas costas.
Amor pesa muito.
São toneladas de nuvens coloridas
orquestra completa
com piano de cauda
regida por um elefante multicor.
Tudo isso foi levado
 e fiquei leve
como um corpo
sem carne
sem osso
leve leve
como uma alma penada.