ANDRÉ BARROS -
Afinal, o que é muita maconha e o que é pouca maconha? Apesar de pequenas mudanças favoráveis na lei de drogas, ainda é difícil definir as quantidades necessárias para diferenciar usuário de traficante. E o pior: estes obstáculos na lei acabam prejudicando ainda mais cultivadores e maconheiros que nada tem a ver com o crime organizado. Entenda mais sobre a questão com o advogado e ativista, André Barros.
A Lei 11343/2006 acabou com a pena de prisão para usuários de todas as drogas e para quem plantar pequena quantidade para uso próprio. Por outro lado, a pena mínima para o tráfico de drogas aumentou para 5 anos de prisão. Ficou estabelecido que essa pena dever ser reduzida em até até dois terços – chegando a um ano e dez meses-, se o condenado for primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas, nem integrar organização criminosa.
A Lei 11343/2006 vai completar 10 anos e, até hoje, não existe uma decisão que estabeleça um limite ou definição do que vem a ser uma pequena quantidade de plantas. Mesmo conhecendo muito bem a lei, pois prestam concursos dificílimos, grande parte dos delegados, promotores e juízes, deliberadamente, não aplicam a norma. Ou pior, como a lei melhorou para o usuário, os aplicadores do direito, por represália, quase sempre condenam usuários e plantadores no trafico de drogas. Vêm sendo aplicadas, propositalmente, penas acima de 4 anos de reclusão. Uma pena superior a quatro anos de prisão não pode ser substituída pela restritiva de direitos, o que é estabelecido no artigo 44, inciso I, do Código Penal.
O que de fato assistimos, em muitos julgamentos, é a um verdadeiro abuso de autoridade. O denunciado, por questões envolvendo drogas, responde ao processo preso. Meses depois, na audiência, em praticamente todos os casos, o promotor pede a desclassificação do artigo 33 para o artigo 28 da Lei 11343/2006, confirmando que ele era usuário. Ainda costuma-se solicitar que seja declarada extinta a punibilidade. O promotor sai do caso como se tivesse sido generoso, pois o plantador continua primário e de bons antecedentes, porém com uma marca do pesadelo que é passar meses preso numa cadeia. O trauma e o medo são tão grandes que o plantador sequer entra com uma ação de indenização contra o Estado, mesmo tendo recebido uma punição que extrapolou a da sentença.
Alguém primário, de bons antecedentes, que não integra grupo criminoso nem se dedica a atividades criminosas, deveria responder ao processo em liberdade. Pois, se ao final do processo, pode ser condenado a uma pena restritiva de direitos, não tem sentido, no curso do processo, ficar preso. Portanto, o maior problema não reside na lei, mas sim nos aplicadores da lei. Delegados, promotores, juízes, desembargadores e ministros sabem de tudo isso, mas não respeitam a lei e a Constituição, que juraram cumprir. Assim, as cadeias estão superlotadas de pessoas condenadas por tráfico, em sua maioria. Como se explica de um mercado ilegal, bilionário, de toneladas, não saia um milionário preso? Essa guerra às drogas é uma verdadeira farsa.
*Advogado da Marcha da Maconha, ativista dos Direitos Humanos e pré-candidato a vereador do Rio de Janeiro pelo PSOL.