ANDRÉ BARROS -
No final de semana passado, a Marcha da Maconha da Ilha do Governador foi uma festa linda e democrática – mas que também foi marcado pela atitude truculenta de apenas um membro da Polícia Militar carioca, que bradou os dizes “Odeio maconheiro e odeio maconha!”.
No último sábado, dia 23 de abril de 2016, realizamos a Marcha da Maconha da Ilha do Governador, um lindo bairro do Rio de Janeiro situado na Baía de Guanabara. A concentração começou às 19:20, perto do simpático quiosque Mexicano. Colocamos uma pequena faixa entre dois postes convocando para o evento. Minutos depois, chegaram dois policiais numa viatura nos mandando retirar a faixa. Fui até aos policiais com o nosso ofício, que avisava sobre a Marcha, com todos os detalhes de trajeto e horário, citando o artigo 5º, inciso XVI, da Constituição Federal.
Cheguei com toda educação, me apresentando como advogado. Falei da decisão do Supremo Tribunal Federal que garante a Marcha da Maconha e que tínhamos avisado através daquele ofício, como manda a Constituição Federal. De maneira nem um pouco simpática, o policial disse que se eu era advogado deveria saber que não poderia colocar qualquer coisa em postes públicos. Argumentei se ele não toleraria aquela mínima faixa para marcar o local da nossa saída. Ele olhou bem pra mim e respondeu: “odeio maconheiro e odeio maconha”. E ainda ameaçou multar todos os carros que estavam ali, disse para tirar a faixa imediatamente, mas que iria acompanhar a nossa Marcha.
A faixa foi retirada, mas estávamos tranquilos com a confirmação de que o evento não seria impedido de acontecer. Batucamos um pouco e cantamos o tradicional “1,2,3,4,5, mil, vamos legalizar a maconha no Brasil”. Em torno de 50 pessoas se preparavam para seguir com a Marcha da Maconha da Ilha do Governador ao longo da belíssima praia da Bica, quando o policial chegou mais uma vez pedindo para ver o ofício. Mostramos o documento, ele leu atentamente, virou para mim e bem seco disse: “coloca seu pessoal do lado direito sem fechar a avenida”. Esclareci que não era o organizador da Marcha e estava ali como advogado. Aí ele respondeu: “e eu sou tenente”. Quase perdi a cabeça, pois não estava disputando qualquer patente com ele, mas respirei e disse: “estou apenas querendo estabelecer um bom diálogo e uma relação urbana com uma autoridade policial, como deve ser o tratamento de um advogado com um policial”. Ele apenas ouviu a minha resposta e nada disse.
Falei com os organizadores e a Marcha saiu alegre e pacífica como sempre. Até que veio o tradicional grito: “polícia, polícia, maconha é uma delícia”. Imediatamente, o tenente veio em minha direção com um gás de pimenta na mão e uma enorme espingarda pendurada dizendo que iria meter a porrada em todo mundo se aquele grito continuasse. Sentindo que rolava um estresse, a galera emendou com o grito que marcou as imensas manifestações de 2013: “não acabou, tem que acabar, eu quero o fim da polícia militar”. Mais uma vez, o tenente veio em minha direção dizendo que não aceitaria aquele tipo de provocação. Disse a ele que eu não poderia impedir o grito que naquele momento já era de cerca de 100 pessoas e que não era nada contra ele, mas que elas estavam garantidas pela livre manifestação de pensamento e pela liberdade de expressão.
Desta forma, levamos a Marcha da Maconha até a outra ponta da praia da Bica. Naquele lindo lugar, nossa alegria e a beleza da causa conseguiram contagiar a todas e todos na orla. Os carros passavam buzinando em tom de festa, as pessoas sorriam e fotografavam nosso evento dos quiosques. Assim, chegamos em paz ao final da praia. Mas, para não perder a autoridade, o tenente chegou mais uma vez e falou comigo: “se você é advogado, sabe que existe a lei do silêncio”, dizendo que o Planta na Mente não poderia continuar tocando, pois já passava de 10 horas da noite. Respondi que iríamos parar, mas era tradicional terminar o evento com um jogral. O discurso coletivo foi realizado e acabamos o evento cantando: “não tenha vergonha, não tenha vergonha, 7 de maio é a Marcha da Maconha!”
*Ilustração de capa: Angeli.