Por JOAQUIM DE CARVALHO - Via DCM -
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| Pista em Claudio. |
Uma das razões que levaram
o Ministério Público de Minas Gerais a arquivar a denúncia contra o senador
Aécio Neves pela construção do aeroporto de Cláudio é a explicação dada pelo
governo do Estado, durante a gestão do próprio Aécio, em 2009, de que o
aeroporto de Cláudio fazia parte de um “amplo programa” de modernização dos
aeroportos do Estado. Outra é o conteúdo de uma carta do prefeito de Cláudio,
aliado de Aécio, que diz que a chave do aeroporto ficava com a prefeitura, não
com um parente de Aécio.
No inquérito, não existe uma perícia sobre o preço do pista – quase 14 milhões
de reais. Tampouco há um estudo independente sobre a real necessidade do
aeroporto na cidade, já que Divinópolis, a menos de 50 quilômetros dali, tem um
aeroporto que serve à região.
Quatro promotores que
atuam na defesa do patrimônio público de Minas Gerais conduziram a
investigação: Maria Elmira Evangelina do Amaral Dick, Fernanda Caram Monteiro,
Tatiana Pereira e José Carlos Fernandes Júnior. Eles poderiam ter ouvido o
ex-vereador do município de Cláudio Israel de Souza, o primeiro a denunciar o
aeroporto como símbolo da utilização de dinheiro público para fins privados.
Israel conhece toda a história.
Não há depoimentos no
inquérito do Ministério Público, só documentos, e todos eles são dos órgãos
oficiais, e ainda por cima emitidos no tempo em que Aécio Neves ou seu sucessor
e aliado Antônio Anastasia governaram o Estado. Também foi colhida a
manifestação dos advogados de Aécio.
Eu estive em Cláudio no
ano passado, depois que a Folha de S. Paulo publicou a denúncia do aeroporto, e
vi agora o inquérito civil sobre aeroporto, que pela segunda vez o Ministério
Público mandou arquivar. Segunda vez? É isso mesmo.
A investigação começou em
2009, quando Aécio governava o Estado. A origem é um e-mail enviado à ouvidoria
do Ministério Público, por um homem que se apresenta como João Guilherme
(provavelmente nome fictício).
O denunciante questiona a
necessidade de construção do aeroporto na cidade que tem cerca de 30 mil
habitantes e é vizinha de Divinópolis, onde já existia um aeroporto regional.
O denunciante não cita o
nome de Aécio, dono de uma fazenda perto do aeroporto nem cita o fato de que o
aeroporto foi construído na terra do tio-avô de Aécio, Múcio Tolentino, mas,
pelos termos que utiliza, tudo indica que é para Aécio que ele quer que os
promotores olhem.
Quase cinco anos depois,
em 14 de fevereiro de 2014, quando Aécio tinha sido anunciado pelo PSDB
candidato a presidente (não tinha sido oficializado, mas fazia campanha),
promotores encerraram a investigação, com a decisão de arquivá-la, pois consideravam
o aeroporto de Cláudio não representava mau uso de dinheiro público.
O nome de Aécio ou de
qualquer membro de sua família não aparecem no inquérito. O nome do
ex-governador só vai ser relacionado ao aeroporto em julho do ano passado,
cinco meses depois da decisão do primeiro arquivamento do inquérito. Aécio já
estava em campanha para presidente, quando a Folha de S. Paulo publicou a
reportagem.
Com a publicação, o
Ministério Público reabriu a investigação, para apurar ato de improbidade
administrativa (um dos tipos de improbidade é caracterizado quando governante
ignora o princípio da impessoalidade). Construir aeroporto nas terras da
família não seria propriamente atitude desprovida de interesse próprio.
Mas, no último dia 7 de
julho, decorrido um ano da reabertura do inquérito, os mesmos promotores
decidiram mais uma vez arquivar a denúncia, e mais uma vez o inquérito só traz
a versão oficial – a do governo do Estado ao tempo em que Aécio governava o Estado,
e a da prefeitura de Cláudio no presente, que diz que é mentira a denúncia da
Folha de que a chave do aeroporto ficava com o tio de Aécio.
Quando estive em Cláudio,
ouvi de mais de uma pessoa que no aeroporto só entrava quem o tio de Aécio
deixasse. Inclusive, por generosidade dele, é que aficionados do aeromodelismo
usavam o local para festivais. Também vi que o cadeado era diferente daquele
mostrado em foto da Folha. Segundo um morador, a troca ocorreu depois da
denúncia, supostamente pela recusa de Múcio de devolver as chaves.
Em uma conversa com o
filho de Múcio Tolentino, Kedo, primo de Aécio, ouvi o que ele disse sobre a
intenção de um industrial da cidade em relação ao aeroporto. “O Pedro Cambalau
me disse que, se o Múcio deixasse, ele usaria o aeroporto”. Como assim, Múcio
deixasse? Não era a prefeitura que tinha as chaves?
Para verificar que em
Cláudio o aeroporto foi colocado na frente de muitas prioridades, não é preciso
muito esforço. Nas ruas, qualquer pessoa diz que é absurdo construir aeroporto
numa cidade que não tem um grande hospital.
A denúncia anônima que deu
origem ao inquérito não cita o município mineiro de Montezuma, onde família de
Aécio tem uma fazenda e outro aeroporto foi reformado. Mas os promotores
incluem o nome Montezuma e estabelecem uma relação entre esta obra e a de
Cláudio, sem mencionar que a família de Aécio também, em tese, se beneficiou
com a obra em Montezuma. Os promotores preferem falar de uma suposta suspeita
de superfaturamento e afastá-la por completo.
“Restou esclarecido que as
obras no aeródromo do Município de Cláudio-MG referem-se à ampliação e ao
aumento da capacidade, seguindo rigorosos requisitos técnicos, enquanto que as
intervenções no aeródromo de Montezuma-MG referem-se apenas a duas pequenas
intervenções visando à recuperação e o apoio à estrutura já existente”,
escreveram os promotores.
O que vi nos dois
inquéritos do Ministério Público não é o mundo real. Mas produziu efeitos na
realidade política do Estado. O PSDB de Minas divulgou nota para dizer que a
decisão “demonstra a exploração política injusta que o tema teve durante as
eleições do ano passado”. Aécio não quis comentar. E precisava?




