IGOR MENDES -
Com o recrudescimento da disputa eleitoral os ânimos mais
exaltados se põem a gritar até quase ficar roucos: não votar, abster-se, ou
anular o voto, serve à direita. Essas vozes, entretanto, não podem responder
satisfatoriamente à pergunta sobre o que exatamente entendem por “esquerda”.
Sim,
porque se por “esquerda” entendem uma soma de crédito, Bolsa Família e
agronegócio –tudo misturado e temperado com uma boa, mas muito boa mesmo dose
de (contra) propaganda –devemos responder-lhes que essa “esquerda” é igualzinha
à direita que tanto ataca.
Tal
argumento, ademais, não possui sequer o mérito da originalidade. Porque não é
de hoje que o fantasma da direita é usado para mascarar o direitismo de quem o
acusa. Tomemos junho. Tomemos a Copa. Segundo esse curioso raciocínio, a
“esquerda” estava no alto dos palácios governamentais, protegida por nossa
“republicaníssima” polícia; e a “direita” estava nas ruas cercando aqueles
palácios, tomando paulada desta polícia.
Estranho!
Tomemos
agora as eleições. As três principais candidaturas (Dilma, Marina e Aécio)
somam, juntas, um orçamento de quase 1 bilhão de reais –no caixa 1, declarado à
Justiça Eleitoral. Nem Dilma nem Marina, que pretendem se apresentar “pela
esquerda”, tocam nem por alusão a questões pendentes há séculos como a absurda
concentração de terras no Brasil (que se reforçou sob a década petista), o
confisco das dívidas interna e externa ou o fim do arrocho salarial continuado
sobre os trabalhadores. Sobre o direito ao aborto, cruzes!, dá mais voto
inaugurar templos e dizer que “feliz é a nação cujo Deus é o Senhor”... Citamos
propositalmente algumas medidas que nada têm de socialistas, nem de
anticapitalistas, mas possuem simplesmente caráter democrático, progressista.
Mas nem mesmo estas questões básicas estão colocadas por quaisquer dessas
candidaturas, nem poderiam estar –exatamente porque essas candidaturas são,
todas elas, de direita, independente de como se pintem a si mesmas.
Quanto
às candidaturas dos demais partidos “socialistas” e “comunistas”, que dizem
representar o voto dos protestos, devemos responder-lhes simplesmente: não os
representam. Basta olhar as estatísticas. Nas primeiras eleições posteriores às
jornadas de junho esses partidos têm as mesmas intenções de voto, ou mesmo
menos, que nos pleitos anteriores. Porque passaram ao largo dos protestos
contra o aumento das passagens, os quais sempre ignoraram por serem “pequenos”,
com ar de aristocrática superioridade; porque estavam por demais preocupados
com as próximas eleições do DCE, ou do sindicato, entidades nas quais
reproduzem as mesmas práticas de aparelhamento que dizem combater em âmbito
nacional. De modo que quando apareceram com suas bandeiras e carros-de-som, lá
pela segunda ou terceira semana de protestos, já era tarde. Foi uma relação
recíproca. Esses partidos passaram ao largo das manifestações de junho, que por
sua vez passaram ao largo desses partidos. E passaram muito bem, obrigado.
Não
votar, por si só, não vai mudar o país. O boicote, entretanto, passa um recado
claro de rechaço ao Estado brasileiro. Não votar é ser coerente com as
sucessivas revoltas populares que têm sacudido o Brasil, e produzirão novas
ondas nos próximos meses e anos. Não votar é se recusar a cair no conto do “menos
pior”, do qual a falácia de que a abstenção serve à direita é apenas uma
derivação mais intelectualizada e um pouquinho menos cínica. Não votar é
rechaçar o roubo, a repressão e o descalabro contra os trabalhadores praticado
por todas as siglas em todas as esferas de governo. Não votar é não legitimar a
“democracia” onde os torturadores estão impunes e os presídios superlotados –de
pobres.
Se
eleições mudassem alguma coisa, os eleitores seriam cercados pela Tropa de
Choque e detidos para averiguação quando estivessem a caminho da zona
eleitoral. Como tem acontecido quando os autênticos direitos populares estão em
jogo.