Via Congresso em Foco -
Supremo pede à Procuradoria-Geral da
República que apure repasses do doleiro Alberto Yousseff para a conta do
senador e ex-presidente da República. Petebista se diz perseguido, mas
não explica origem de depósitos.
Candidato à reeleição, o senador e ex-presidente da República Fernando
Collor (PTB-AL) está às voltas com nova investigação no Supremo Tribunal
Federal (STF). Quatro meses depois de ter se livrado da última acusação
a que respondia na corte ainda referente à sua turbulenta passagem pelo
Planalto, Collor agora é alvo de um inquérito para apurar suas relações
com o doleiro Alberto Yousseff, preso na Operação Lava Jato sob
a acusação de ser um dos chefes de um esquema de lavagem de dinheiro
que movimentou ilegalmente R$ 10 bilhões no país e jogou a Petrobras
para o centro de duas CPIs no Congresso.
A suspeita sobre o ex-presidente foi remetida ao Supremo, onde correm
as investigações envolvendo parlamentares federais e outras
autoridades, pelo juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sérgio Fernando
Moro, após a Polícia Federal identificar comprovantes bancários que
mostravam depósitos feitos pelo doleiro, no valor de R$ 50 mil, na conta
do senador. Segundo a PF, o repasse foi dividido em oito depósitos em
espécie: R$ 1.500, R$ 9 mil, R$ 1.500, R$ 9 mil, R$ 8 mil, R$ 9 mil, R$ 8
mil e R$ 4 mil.
Quando a notícia sobre os depósitos foi revelada, Collor reagiu. “Não
sou alvo de nenhuma investigação, menos ainda suspeito naqueles
inquéritos”, disse o senador da tribuna do Senado em 26 de maio. De lá
para cá, a situação mudou. O Congresso em Foco
localizou na página do Supremo na internet o Inquérito 3883, até então
desconhecido do público em geral. O procedimento foi aberto no dia 7 de
julho pelo ministro Teori Zavascki, depois que a Justiça Federal no
Paraná enviou para o Supremo 67 páginas de documentos.
Zavascki designou o juiz Márcio Schiefler para cuidar do caso. Há
duas semanas, foi publicada a decisão de Schiefler para mandar a
papelada à Procuradoria-Geral da República, que vai começar o trabalho
de apuração de fato. O inquérito contra Collor não tem ligação com a nova fase da Operação Lava Jato, iniciada nesta sexta-feira (22) e que tem como principal alvo o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa.
Sem explicação
Collor nunca explicou a origem do dinheiro em suas contas, mas
garantiu não ter relações com Yousseff. Em maio, disse que pediria
“dados mais concretos” a Moro e Zavascki antes de prestar
esclarecimentos. “Não convém, de forma prematura, alimentar uma
contenda”, disse ele, ao criticar a revista Veja, que noticiara os fatos.
Passados três meses, o Congresso em Foco procurou Collor novamente. Mas, na quinta-feira (21), o site
não obteve nenhuma explicação dele e de seus assessores sobre a origem
dos depósitos de Yousseff ou mesmo dos “dados mais concretos” que o
ex-presidente buscava.
Para a Polícia Federal, o doleiro era o verdadeiro dono do
Laboratório Labogen, que firmou parcerias no Ministério da Saúde com o
apoio do ex-vice-presidente da Câmara André Vargas (ex-PT-PR), que, para
o Conselho de Ética da Casa, deve ter seu mandato cassado. A PF
suspeita que um dos sócios do doleiro na empresa seja Pedro Paulo Leoni
Ramos, amigo e ex-integrante do governo Collor.
O ex-presidente não nega o bom relacionamento que mantém com seu
ex-ministro de Assuntos Estratégicos. “Mantenho com ele e a família, há
mais de 30 anos, relação de amizade e respeito”, disse o senador em
maio. O petebista, no entanto, rechaça qualquer contato com Yousseff.
“Posso afirmar, de forma e de modo categóricos, que não o conheço e
jamais mantive com ele qualquer relacionamento de ordem pessoal ou
política.”
Com o inquérito na assessoria criminal do procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, caberá ao Ministério Público Federal decidir
os rumos da investigação, como pedidos de quebra de sigilo, perícias e
tomadas de depoimentos. Até ontem (21), essa avaliação ainda não havia
começado.
Ações do Paraná
A Operação Lava Jato resultou na prisão de doleiros e de diversos
clientes deles, como o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo
Roberto Costa. Collor não era alvo da apuração, mas as ações de busca e
apreensão nos endereços de Yousseff encontraram os comprovantes de
depósito. Por isso, o juiz Sérgio Moro enfatizou ao STF que, naquele
momento, não havia “qualquer indício do envolvimento” do senador nas
oito ações criminais em andamento em sua Vara no Paraná.
Para Collor, as declarações do juiz foram entendidas como um salvo
conduto. “O principal teor do expediente do juiz Sérgio Moro ao ministro
Teori Zavascki foi sua taxativa declaração de que não há qualquer
envolvimento meu nos oito inquéritos da Polícia Federal vinculados
àquela operação”, disse o senador em maio passado.
Mas, conforme apurou o Congresso em Foco, as
afirmações são apenas parte das formalidades do processo. Moro fez
questão de explicitá-las por dois motivos. Primeiro, porque realmente o
nome de Collor apareceu no caso inesperadamente. Segundo, porque, ainda
que acreditasse haver provas de participação do senador em qualquer
crime, ao mencionar isso Sérgio Moro traria para si um batalhão de
advogados dos réus pedindo que toda a Operação Lava Jato fosse anulada.
Afinal, parlamentares só podem ser investigados e julgados pelo Supremo
Tribunal Federal.
22 anos
Em 24 de abril, o STF arquivou um processo a que Collor respondia
pelos crimes de peculato (desvio de dinheiro público), falsidade
ideológica e corrupção passiva por falta de provas. A acusação era da
época em que ele foi presidente da República, entre 1990 e 1992.
Ao recomendar a absolvição do ex-presidente, o primeiro a sofrer
processo de impeachment na história do país, a ministra Cármen Lúcia
criticou a fragilidade da acusação. “É preciso certeza, não basta
probabilidade”, afirmou a relatora. “Não é um primor de denúncia, na
minha opinião.” A decisão, segundo o senador, “reescrevia” a história do
país e mostrava que ele havia sido alvo de um “golpe” do Congresso.