IGOR MENDES -
Diariamente
somos assaltados com imagens mostrando a brutalidade do chamado Estado
islâmico, decapitando reféns e executando pessoas inermes, no Iraque e na
Síria. Chama atenção que as atrocidades e crimes de lesa-humanidade praticados
pelo Estado de Israel em Gaza, encerrando toda a população em um imenso campo
de concentração, praticando o genocídio planejado e consciente, mutilando e
exterminando indiscriminadamente crianças, mulheres grávidas e anciãos, não merecem
a mesma repulsa e condenação por parte da “comunidade internacional”.
Assistimos,
repetidamente e por dias a fio, as cenas realmente chocantes do jornalista
norte-americano James Foley, ajoelhado e completamente
indefeso, ao lado do carrasco munido de uma faca, com a qual romperia minutos
depois sua cabeça. “Que país confuso e atrasado é esse Iraque”, pensaram
milhões que assistiram a cena, já que os mesmos noticiários que replicam o fato
não se preocupam de maneira alguma em explicar as suas causas - dentre elas o
fato de que a agressão imperialista ao Iraque e à Síria mergulhou esses países
no caos e numa série de confrontos sectários.
“Que
país bárbaro esse, onde carrascos decapitam reféns inermes?”, se choca o
cidadão comum.
Ocorre
que na mesma semana, na Penitenciária Estadual de Cascavel, no Paraná (que é um
dos cinco Estados mais ricos da Federação), dois reféns foram decapitados numa
rebelião contra as péssimas condições carcerárias. Não mereceram os dois reféns
a mesma comoção e espaço no noticiário que o jornalista norte-americano, embora
todas as constituições do chamado “mundo cristão- ocidental” – incluindo a
nossa – consagrem que todos os homens nascem livres e iguais.
E
então, que país bárbaro é esse, chamado Brasil?
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Presos foram decapitados durante motim no presidio de Cascavel |
Esse
é o país aonde a população carcerária aumentou 403,5% nos últimos 20 anos, ao
passo que a população total registrou crescimento de 36%, no mesmo período.
País onde, em 2013, 14,1 milhão de famílias (aproximadamente 50 milhões de
pessoas, um quarto da população) dependeram do Bolsa Família para sobreviver.
País onde 1% dos proprietários fundiários detém 43% das terras agricultáveis, e
os 10% mais ricos concentram 50% da renda nacional.
País
onde à grande parte de sua população são negados os direitos mais elementares
–inclusive o direito à vida, pois a pena de morte existe na prática, à revelia
da legalidade, para os mais pobres, e todo mundo sabe disso.
Exatamente
por isso esse país chamado Brasil – na verdade, o Estado brasileiro - é
obrigado a fazer da expansão das polícias a sua verdadeira política social, e
da expansão do sistema penitenciário sua política habitacional por excelência.
Não
é esse o Brasil que aparece na televisão, nem na campanha eleitoral, nos
programas preparados com esmero pelos marqueteiros. Mas é nessa realidade
absurda em que vive, de fato, a grande maioria dos brasileiros.
*
E
é para esse sistema carcerário desumano para o qual foi mandado Rafael Braga
Vieira, negro, morador de rua, preso na passeata de 1 milhão no Rio, a
20/06/2013, portando uma garrafa de pinho-sol – e por isso acusado e condenado
por porte de material explosivo. Apesar de toda campanha movida pelos
movimentos populares em defesa de sua libertação – campanha que veio tarde mas,
enfim, antes tarde do que nunca –não se conseguiu reverter sua condenação,
mantida pelo Tribunal de Justiça em sessão no último dia 26/08.
Triste país esse no qual os juízes assumem, eles
próprios, o papel de carrascos.