CARLOS CHAGAS -
Um estranho fenômeno vem marcando a Copa do
Mundo, depois da partida inicial no Itaquerão: a fuga dos políticos. Não
é apenas a presidente Dilma, que em seguida à vaia inicial decidiu
ficar diante de seu aparelho de televisão. Os demais candidatos
presidenciais também não aparecem. Governadores, nem pensar. Ministros,
só bissextamente, por obrigação, como o das Relações Exteriores para
acompanhar o príncipe Henry, ou o dos Esportes, por sua própria razão de
ser. Pior ficam as ausências quando se trata do Congresso. Nem
presidentes da Câmara e do Senado, nem dirigentes dos partidos ou
líderes da maioria e minoria. Todos fogem dos estádios como o diabo da
cruz, com medo das vaias.
Se algum político desmentir
essa conclusão, provando ter comparecido, basta indagar com que disfarce
ele esteve presente: bigodes falsos ou peruca?
Logo depois da Copa do
Mundo de 1950, com o Maracanã aberto ao povão por conta do baixo preço
dos ingressos, o presidente Getúlio Vargas compareceu a um Fla-Flu de no
mínimo cem mil torcedores. Anunciada sua presença pelos alto-falantes,
ninguém vaiou, mas poucos aplaudiram. Atrás dele estava o prefeito do
Rio, Angelo Mendes de Moraes, por sinal o construtor do maior estádio do
mundo. Fiado em que seria aplaudido, mandou o locutor oficial registrar
seu nome. Seguiu-se a primeira das centenas de milhares de vaias que
marcam os campos de futebol: a multidão em peso gritou por muitos
minutos: “Água! Água!”, uma referência explosiva a uma das maiores
mazelas da cidade maravilhosa, a falta da própria.
Nas
décadas seguintes, Juscelino comparecia, mas nada de querer seu nome
anunciado. No período militar, só Garrastazu Médici gostava de futebol,
mas ia escondido, numa das cabines destinadas aos narradores do rádio.
Isso até a conquista da copa pelo Brasil, em 1970, no México. Na
véspera, o general reuniu a imprensa , alertada para não fazer perguntas
políticas, só esportivas. Um puxa-saco indagou se ele arriscaria um
palpite e veio a resposta: “Brasil, quatro a um”. Faltando dez minutos
para o encerramento, ganhávamos de três a um, com o país dividido de
alto a baixo. Quando o Pelé pegava na bola, metade da população colada
nos aparelhos de televisão gritava “mais um, mais um”, enquanto a outra
metade exortava o craque a chutar para trás ou para a lateral. Pois não é
que ele passa para Carlos Alberto, que vinha desabalado e consagrou a
previsão do ditador! Dali por diante, Médici mandava anunciar sua
chegada na tribuna de honra e, durante meses, era aplaudido de pé nas
arquibancadas e na geral, do povão. Claro que durou pouco aquela ilusão,
mas como foi difícil de aguentar…
Esses
episódios se recordam porque agora tudo mudou. É o povo, elitizado ou
não, segundo comentário do ministro Gilberto Carvalho, que manifesta seu
repúdio a qualquer tipo de autoridade, começando pela presidente da
República. Nos estádios e fora dos estádios, como ainda se viu dois dias
atrás no Amapá. Os políticos estão certos quando preferem assistir os
jogos pela televisão…