Via AMAHOR -
Há um desvio na análise da questão da remoção das famílias do Horto.
Onde fica o Horto? O povo, em geral do estado do Rio de Janeiro e do Brasil, não localiza bem o Horto, que fica agregado ao Jardim Botânico, um dos acervos naturais mais importantes e valiosos da cidade do Rio de Janeiro. Feita a localização, cabe então enegrecer problemática em torno da questão da remoção de famílias que ali residem e não querem e não precisam sair dali, tentando responder à questão: como podem negros e negras descendentes de escravos imaginarem compartilhar um dos espaços mais valiosos do Brasil? Quem permitirá isso?
Onde fica o Horto? O povo, em geral do estado do Rio de Janeiro e do Brasil, não localiza bem o Horto, que fica agregado ao Jardim Botânico, um dos acervos naturais mais importantes e valiosos da cidade do Rio de Janeiro. Feita a localização, cabe então enegrecer problemática em torno da questão da remoção de famílias que ali residem e não querem e não precisam sair dali, tentando responder à questão: como podem negros e negras descendentes de escravos imaginarem compartilhar um dos espaços mais valiosos do Brasil? Quem permitirá isso?
Quando eu falo que o Horto não é bem localizado pelo povo brasileiro,
incluo até a ilustre e prezada companheira Dilma que, não conhecendo a
situação das pessoas envolvidas na questão do Horto, corre o risco de
contrariar todos os avanços, princípios e propósitos do combate ao
racismo e promoção da igualdade racial numa penada.
Apesar de não poder ser caracterizada como comunidade tradicional
remanescente de quilombos por questões técnicas e formais, podemos dizer
que a população que habita o Horto, e que neste momento corre o risco
de remoção para Benfica, é negra e guarda um patrimônio remanescente
secular que pertenceu a negros e negras escravos (as) trabalhadores (as)
e que está no Horto, ainda hoje, e pode ser qualificado como um sítio
que guarda presença de um tempo pretérito que devemos salvaguardar, ter
na memória “para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça” – a
escravidão. O Horto era o espaço de grandes engenhos, logo passagem de
negros e negras que participaram do enriquecimento daquela localidade e
das pessoas brancas, herdeiras ou posseiras que hoje lá habitam.
O valor agregado àquele notável patrimônio natural advém de um
equipamento sociocultural importante que valoriza o corredor cultural da
Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro. Trata-se de um corredor com um
grande acervo natural no seu entorno, praias, lagoa, morro, acesso à
floresta, jardins, parques, um equipamento cultural invejável: teatros,
cinemas, livrarias e shoppings, os mais importantes da cidade estão
localizados neste corredor, além de uma concentração de escolas, cursos e
universidades. É desse local, sob falsas alegações, que querem remover
famílias que pertencem a um segmento da população historicamente
excluído: a população negra. Além de falsas e infundadas alegações, uma
forte dose de preconceito racial que determina também historicamente um
“não lugar”, a invisibilidade, a exclusão da população negra de espaços
valorizados e de poder tal como a universidade. O que ocorre no Horto é
exatamente o que a classe média/alta racista queria que permanecesse nas
universidades, um quadro populacional quase exclusivamente branco com
raríssimas exceções.
Cabe agora verificar que estão pedindo que 521 famílias que não querem
ser removidas sendo que 78% destas famílias são de pretos e pardos
sejam deslocadas para o bairro de Benfica, na zona norte da cidade do
Rio de Janeiro, potencialmente desvalorizada, pois não tem, nem de perto
parte do valoroso acervo sociocultural e educacional da Zona Sul,
tampouco seu acervo natural riquíssimo.
Tira-se a parte pela preta do Horto, livra-se da pobreza e da
negritude e põe o preto pobre na periferia, no lugar que a elite branca
reservou apoiada pela perniciosa e racista rede de televisão.
Assim revelamos o racismo institucional que está por trás desta
questão. Esta população que habita o Horto não quer ser removida, não
corre riscos, não compromete a natureza, muito pelo contrário, ajuda na
sua preservação, mas tem um problema traz a diferença racial para o
espaço nobre da Zona Sul. A elite se revela racista na medida em que
quer promover um apartheid, caminhando na contramão da história. A
hipocrisia, juntamente com o mito da democracia racial, cai por terra e a
sociedade brasileira expõe sua chaga – o racismo.
Vamos combatê-lo veementemente. Somos contra a discriminação racial e
todas as formas de intolerância. Queremos justiça social e igualdade de
direitos. Queremos poder viver livres. Sem discriminação, podendo
usufruir de todos os bens sociais produzidos pela humanidade e, no caso
do Horto, produzidos por homens e mulheres negros (as) e brancos (as),
então porque só os brancos podem morar no Horto?
*Texto da Professora Glorya Ramos.



