Sede da seleção brasileira de futebol, Teresópolis foi atingida por forte chuva que provocou enchentes e deslizamentos, deixando centenas de mortos e milhares de desabrigados em janeiro de 2011. |
Enquanto o clima na região central de Teresópolis é de festa para
receber a Seleção Brasileira de Futebol a partir desta segunda-feira
(26), em bairros afastados a sensação é de apatia e até revolta. Se a
entrada da cidade está decorada com pórtico e bandeiras coloridas, na
zona rural a cor predominante é a da poeira e das marcas deixadas pela
enxurrada que provocou mais de 900 mortes em toda a região serrana,
cerca de 350 só em Teresópolis. Pessoas que perderam tudo nas chuvas de
janeiro de 2011, incluindo casa e parentes, reclamam de abandono e dizem
que não estão nada entusiasmadas com a Copa.
“Para mim, não
tem clima de festa nenhum. Eu perdi minha família quase toda. Perdi
minha mulher e minha filha. Minha casa, não ficou um tijolo em pé. Só
não morri porque Deus não quis me levar. Mas torcer pela seleção, nós
vamos torcer”, disse o cortador de pedras Luiz Cláudio Carvalho dos
Santos que, na última sexta-feira (23), cortava à mão uma rocha, fazendo
lajotas e paralelepípedos, no que restou do bairro de Campo Grande, o
mais afetado na cidade.
Campo Grande foi arrasado por uma
cabeça d´água que desceu da serra e destruiu as casas em poucos minutos,
deixando dezenas de mortos. Todos os moradores foram posteriormente
retirados do local e os imóveis foram condenados e demolidos. Poucas
ruínas ainda permanecem em pé, como testemunho da pior tragédia natural
da história do país. Dentro de algumas ainda estão restos do que já foi
uma residência, com sofá, cama, móveis de cozinha, objetos pessoais e
roupas, tudo estragado pela água e pelo tempo.
O difícil para
os moradores é esquecer as cenas que viram na noite do dia 11 de janeiro
de 2011. O local se parece hoje mais com um bairro fantasma, com poucas
pessoas que resistiram em sair. O comércio, que já teve até
supermercado, se resumiu a dois bares na beira da estrada.
“Hoje em dia, a gente trabalha para sobreviver, pois não tem quase
ninguém. Da minha parte, não tem clima para festa ou Copa. Tem muita
gente que não está nem aí para as coisas. Quem mora aqui está abalado
até hoje. Antigamente, em época de Copa, isto aqui era tudo enfeitado.
Hoje você não vê nada disso, não tem mais animação. Eu só continuo no
comércio para dar assistência às pessoas que ficaram aqui. Seria
injusto, da minha parte, não fazer isso”, contou o comerciante Ricardo
Cavalcante. Ele chegou a ter três comércios antes da tragédia e
atualmente sobrevive com um bar, onde vende bebidas, linguiça frita e
alguns mantimentos para os poucos moradores de Campo Grande, cujo único
lazer se resume a duas mesas de sinuca.
Outras pessoas
perderam, por causa da tragédia, até mesmo o emprego. O técnico de
enfermagem Bruno Polderman, que nos dias que se seguiram à enxurrada
trabalhou no resgate de feridos e na retirada dos mortos, hoje não
consegue trabalho. Por causa da água suja, contraiu uma bactéria que
provocou duas feridas profundas em sua perna, hoje transformadas em
grandes cicatrizes. “Eles não me encostam. Só que eu não consigo emprego
na minha área, por causa das cicatrizes causadas pela bactéria. Minha
casa foi condenada, mas nunca me indenizaram”, disse Bruno, que ainda
mora no mesmo imóvel: “Eu, particularmente, não quero saber de Copa.
Aqui está tudo abandonado. Na cidade fizeram só maquiagem, para agradar
os turistas”.
De acordo com a prefeitura de Teresópolis, entre
agosto e setembro deste ano serão entregues as primeiras 250 casas para
os desabrigados de 2011, devendo chegar a 700 unidades até dezembro
deste ano. A meta é, até 2015, entregar um total de 1.600 residências. A
maioria dos atingidos recebeu indenização ou continua recebendo aluguel
social.