19.12.13

EQUADOR E A "MÃO SUJA" DA CHEVRON

Via Agencia Petroleira de Notícias -

Durante sua recente visita oficial à França, o presidente do Equador, Rafael Correa, se reuniu em Paris com um grupo de intelectuais para expor uma das preocupações de seu país: o conflito que opõe várias comunidades indígenas da Amazônia equatoriana à empresa petrolífera americana Chevron, acusada de destruição ambiental e de danos à saúde de milhares de pessoas. Em escala internacional, este conflito ecológico adquiriu um caráter muito emblemático.

O Equador - primeiro país do mundo a reconhecer, em sua Constituição, os inalienáveis direitos da natureza, convertendo esta em assunto de direito -, enfrenta uma multinacional petrolífera, a Chevron Corporation, que é a segunda mais importante dos Estados Unidos e a sexta do mundo, denunciada por múltiplos casos de contaminação do meio ambiente em diversos lugares do planeta.

"Tudo começou em 1964 - explica Rafael Correa -, quando a empresa americana Texaco (adquirida em 2001 pela Chevron) iniciou sua exploração pterolífera em uma ampla zona da Amazônia equatoriana. Essa atividade durou até 1992. No ano seguinte, as comunidades amzônicas da província de Sucumbíos apresentaram, nos Estados Unidos, uma demanda contra a Texaco, por contaminação ambiental e atentado a saúde dos habitantes. Ou seja, deve ficar claro que não é o Estado equatoriano que leva a Texaco-Chevron aos tribunais, mas sim cidadãos vítimas de um crime ao meio ambiente. A Chevron herdou essa demanda quando comprou e absorveu a Texaco em 2001. Pouco depois, a petição da própria empresa, o caso - que os tribunais dos Estados Unidos se negaram a julgar - foi transferido para uma corte do Equador."

"É importante lembrar - aponta o chanceler equatoriano, Ricardo Patiño, presente na mesma reunião - que a Texaco, antes de se retirar completamente do Equador em 1992, disse ter 'limpado' os dois milhões de selva virgem em que operou. A afirmação é falsa. Pois todos esses terrenos, como qualquer testemunha pode comprovar, encontram-se totalmente degradados, com dezenas de aterros de alcatrão que contaminaram rios e aquiferos. A água, em toda essa região, não é apta para consumo. O número de casos de câncer multiplicou entre a população. Em toda essa selva, a excepcional biodiversidade foi simplesmente assassinada."

"E o pior - assinala Correa - é que o governo equatoriano da época assinou com a Texaco, em 1998, um 'ato de liquidação', em que reconhecia que a empresa havia deixado 'tudo limpo', e a exonerava de qualquer responsabilidade sobre as consequências futuras em seus excessos petrolíferos. Isso é muito importante, pois dá à Texaco-Chevron um argumento enorme. Em caso de demanda contra ela, a empresa pode dizer - e já o fez! "Eu entreguei tudo limpo. Assim foi reconhecido oficialmente pelo Estado equatoriano. Em consequência: qualquer condenação contra mim deve ser assumida pelo Estado do Equador, pois ele é o responsável pelo que ocorreu nesses terrenos após minha partida."

Ainda segundo Correa: "A Corte Provincial de Sucumbios, em janeiro de 2012, condenou a Chevron a pagar uma indenização de 9,5 milhões de dólares por ter causado um dos 'maiores desastres ambientais do mundo' entre 1964 e 1990. Uma soma que se duplicaria - e alcançaria 19 milhões de dólares - caso a empresa não apresentasse desculpas nas semanas seguintes à sentença. Mas a Chevron, para desprestigiar essa decisão judicial e evadir sua responsabilidade, alegou que, nesse julgamento, os advogados haviam falsificados os dados e pressionado os peritos científicos para encontrar contaminação onde não havia. E apresentou um recurso de cassação na Corte Nacional de Justiça."

"Ante essa situação - prossegue o chanceler Ricardo Patiño - a Chevron decidiu amparar-se em um tratado de proteção recíproca de inversões firmado entre Equador e Estados Unidos, que entrou em vigos em 1997. Mas esse tratado, na nossa opinião, não concerne a este caso, pois as demandas das comunidades indígenas contra a Chevron vem desde 1992, e o tratado, estabelecido posteriormente, não contempla aplicação retroativa."
 

"Com esse argumento - explica Correa - a Chevron acudiu à Corte Permanente de Arbitragem de Haia, a qual nomeou, como é habitual nesses casos, um tribunal específico para o assunto. Esse tribunal é composto por três juízes, designados (e pagos) pelas partes em litígio; um pela empresa, outro pelo país e o terceiro pelos outros dois juízes anteriores. Aqui também o poder judicial equatoriano cometeu um erro, pois designou um dos juízes, dando a impressão que o Equador aceitava esse tribunal de arbitragem. Quando, na realidade, nosso governo rechaça esse tribunal."

O tribunal de arbitragem alega que o Equador violou o tratado bilateral de inversões entre Quito e Washington, segundo o qual o Equador deve 'tomar todas as medidas ao seu alcance para suspender ou fazer que se suspenda a execução ou o reconhecimento dentro ou fora do Equador de qualquer sentença contra uma empresa americana.

Em resoluções anteriores, esse tribunal já havia advertido que 'qualquer perda surgida da execução da sentença da Corte de Sucumbios seria uma perda pela qual o Estado equatoriano seria responsável, sob diretrizes do direito internacional.'
 

O presidente Rafael Correa retoma a palavra para explicar que "as decisões do tribunal de arbitragem de Haia foram rechaçadas pelo nosso governo. Primeiro, porque Equador, como Estado, não está implicado nesta querela. Defendemos os direitos das comunidades indígenas afetadas pela contaminação e vítimas dos desmandos de uma multinacional petrolífera. Mas não somos partes em um pleito. E por respeito ao princípio democrático da separação de poderes, não queremos nos intrometer em assuntos do ramo judicial."

Contudo, observamos que, no marco atual da desapropriação da soberania dos Estados, os tribunais de arbitragem possuem cada dia mais poder. Cada vez mais, estão ficando a favor das corporações multinacionais. E se não acatar a decisão do tribunal de arbitragem, o Equador poderia ficar isolado comercialmente e politicamente.

Tudo isso é triplamente escandaloso, porque se a decisão do tribunal de arbitragem se aplicar, o Equador estaria violando sua própria Constituição, pois significaria que nosso governo estaria interferindo com o Poder Judiciário. A Chevron não apenas ficaria exonerada de pagar pela limpeza da floresta e pela reparação às comunidades afetadas, como também poderia demandar pagamentos do povo equatoriano como custo legal do litígio.
 

Consideramos que este caso não é jurídico, mas político: contra nosso governo - conclui o presidente Rafael Correa. "Por isso apelamos à solidariedade internacional. Em todas partes estão se constituindo Comitês de apoio à nossa Revolução Cidadã. E convidamos todos nossos amigos e amigas, da Europa e de todo o mundo, a expressar igualmente seu rechaço à prepotência daquelas empresas multinacionais que destroem o meio ambiente e não assumem suas culpas. A 'mão suja' da Chevron não deve ficar impune".
 

Em novembro, a justiça equatoriana condenou a empresa americana a pagar US$ 9,5 bilhões pela contaminação ambiental atribuída à empresa Texaco, adquirida pela Chevron em 2001 e que operou na Amazônia entre 1964 e 1990