JOSÉ CARLOS DE ASSIS -
A reforma previdenciária proposta por Paulo Guedes não atinge apenas os empregados atuais e aqueles que vierem a ser empregados no futuro. Atinge fortemente os autônomos, entre os quais caminhoneiros e taxistas. No sistema atual, o autônomo pode se aposentar com 35 anos de contribuição, para homens, e 30 anos de contribuição, para mulheres, independentemente de idade. Essa regra, no sistema proposto, é extinta. Não haverá mais aposentadoria por tempo de contribuição. Será uma combinação de contribuição e idade.
Existe, hoje, como possibilidade de aposentadoria do autônomo: idade de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres, acumulados com 15 anos de contribuição. Essa regra não é muito generosa para homens e mulheres que enfrentam, por exemplo, a rotina diária de longas viagens de caminhão pelas péssimas estradas do país, mas, assim mesmo, será piorada se o projeto vier a passar. Os homens terão que trabalhar mais cinco anos e as mulheres, mais dois. E se contribuírem apenas 25 anos, receberão não mais que 70% do benefício.
Para ter o benefício integral o caminhoneiro e taxista, assim como os demais autônomos e também os empregados, terão portanto que trabalhar nada menos que 40 anos. Muitos morrerão pelo caminho, antes de se aposentar. Mas essa é a regra draconiana de Guedes. Como alternativa, ele oferece o regime de capitalização, sobre o qual aprendeu na ditadura chilena, e que se tornou, como em vários outros países, uma fracasso absoluto ao ser aplicado, pois os idosos estão morrendo de inanição ou por suicídio na falta de condições de sobrevivência como aposentados.
Os autônomos já conhecem o regime pelo qual eles próprios sustentam, individualmente, a expectativa de sua previdência junto ao INSS. Pagam contribuições mensais de acordo com as regras acima indicadas, recebendo, quando da aposentadoria, proventos proporcionais à soma da idade com o tempo de contribuição. Atualmente, com 65 anos de idade e 15 de contribuição para homens, e 60 anos de idade e 15 de contribuição para mulheres, eles recebem aposentadoria e pensão integrais. Antes disso, tem benefício proporcional ao tempo de contribuição. Isso tudo acaba.
É claro que o regime proposto representa, em geral, uma piora considerável nas condições de aposentadoria dessas categorias. Mas o regime de capitalização é ainda pior. No caso, os autônomos serão obrigados, se quiserem se aposentar algum dia, a contribuir para um fundo privado administrado por bancos ou empresas financeiras, diferentemente da situação atual, na qual contribuem para o INSS. A diferença é que o banco, ao contrário do INSS, não fica obrigado a garantir um valor determinado de benefício. Este variará de acordo com o resultado das especulações financeiras com o dinheiro do autônomo a serem feitas no mercado privado.
Diferentemente do INSS, o regime de capitalização privado não garante aposentadoria por idade, auxílio doença, salário-maternidade, pensão por morte e auxílio-reclusão para dependentes de segurados de baixa renda, entre outros benefícios. É o reino de cada um por si, e todos pagando um pedágio significativo, ao longo de 40 anos, em favor do sistema bancário e dos especuladores do mercado financeiro.
Em síntese, estamos diante de uma situação, também nesse caso, pela qual uma determinação de caráter estritamente ideológico, a obsessão pela promoção do livre mercado no contexto do neoliberalismo, submete milhões de brasileiros a condições materiais extremamente perversas, seja na atividade atual, seja na expectativa de vida, seja na inatividade futura. Também nas condições de preços dos derivados de petróleo, notadamente o diesel mas também o gás e a gasolina, fundamentais para a subsistência de caminhoneiros e taxistas, essa determinação ideológica perversa está presente, sempre seguindo o receituário neoliberal. Entretanto, pela mobilização em curso, vê-se a possibilidade de fim próximo desse processo.