ALCYR CAVALCANTI -
Direitos Humanos têm sido frequentemente desrespeitados. "A não solução do ‘Caso Marielle’ demonstra de forma inconteste a falta de compromisso do Estado Brasileiro com os defensores de direitos humanos" (Jurema Werneck, Anistia Internacional).
Cinco meses após a intervenção militar na segurança do Estado do Rio de Janeiro muito pouca coisa mudou em relação à violência urbana e às constantes violações de direitos humanos. Em relatório da Anistia Internacional publicado em fevereiro de 2018 sobre ocorrências em 2017 O Brasil é o campeão no número de assassinatos de diversos grupos de pessoas: as vítimas são jovens negros do sexo masculino, defensores de Direitos Humanos, pessoas LGBT, grupos ligados à defesa da terra, e policiais. Para Jurema Werneck “a policia brasileira é a que mais mata e também a que mais morre”. Da mesma forma a população carcerária é recordista em um aspecto extremamente negativo, são 727 mil presos, alguns em condições sub-humanas, sendo 40% (cerca de 290 mil) em prisão preventiva.
Recente estudo do “Observatório da Intervenção Federal do Centro de Estudos da Segurança da Universidade Candido Mendes” verificou que os métodos usados continuam extremamente violentos com crescentes violações de direitos humanos e que os resultados são pífios. O número de tiroteios que causam pânico a toda a população e que tem causado vítimas inocentes tem tido aumento significativo além do número de chacinas ter aumentado. Foram 4005 tiroteios contra 2924 no período anterior à intervenção. A volta dos “autos de resistência” agora com outra roupagem, pois sempre se supõe um enfrentamento que obrigaria o agente policial a uma ação letal também tem aumentado o número de mortes. A vítima é sempre considerada como resistente. Em relatório do segundo trimestre do Instituto de Segurança Pública-ISP órgão da secretaria de segurança os homicídios decorrente da intervenção policial no mês de junho registraram alta significativa de 59,8% em relação ao mês de junho de 2017. Para piorar subiram 9,2% em relação ao mês de maio.
Para a cientista social Silvia Ramos da Universidade Candido Mendes “Não adianta botar cinco mil, dez mil homens nas ruas, porque a segurança pública funciona de outra forma. Funciona com inteligência e observação”. Um dos pontos mais importantes seria isolar os agentes públicos envolvidos com a corrupção. Da mesma forma pensa a socióloga Jaqueline Muniz da UFF e acrescenta que é uma obrigação do estado prestar contas de sua atuação, “porque não existem protocolos da atuação policial que permitam à população acompanhar e monitorar sua atuação”.
A impunidade continua a ditar regras, a maioria esmagadora dos homicídios permanece sem solução. Para o sociólogo Michel Misse somente 15% dos casos são esclarecidos, a capacidade de esclarecimento de homicídios e a punição de seus autores pela justiça criminal brasileira é muito baixa. O “Caso Marielle” que desde antes de ser eleita sempre atuou na Comissão de Direitos Humanos da ALERJ, é apenas mais um caso. Após mais de cento e trinta dias em que a vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes foram mortos no Estácio na Zona Central da cidade, muito pouca coisa ficou esclarecida. Existem dúvidas sobre a condução por parte da investigação policial, até hoje sem nenhum resultado prático. Alguns suspeitos têm sido presos, mas ainda não temos uma conclusão definitiva. A incerteza levou a Anistia Internacional a pedir uma comissão externa independente para acompanhar as investigações.
Em recente entrevista ao Estado de São Paulo Renata Neder da Anistia Internacional acredita que a credibilidade do sistema de justiça criminal está em xeque. “Está claro que as instituições não têm credibilidade, eficácia, competência ou vontade de resolver o caso” afirmou Renata. A possibilidade do envolvimento de agentes do estado aponta para a necessidade de ser criado um mecanismo independente de acompanhamento das investigações. Os pais de Marielle estiveram na sede da Anistia Internacional para reforçar a cobrança de uma investigação mais célere e transparente e receber notícias com mais frequência sobre o andamento das investigações. Em nota a secretaria diz que o caso está em sigilo de investigação. O general Braga Neto, interventor na área da segurança, em nota oficial reclama de falta de apoio oficial e diz que “não há liberdade de ação” além de condenar as manifestações e protestos que tem ocorrido. O sigilo e a confidencialidade que tem como objetivo garantir a eficácia das investigações, não pode ser confundido com o silêncio das autoridades da segurança diante da obrigação de esclarecer corretamente as execuções.
A violência tem aumentado em todo o Estado do Rio de Janeiro e a crescente militarização dos espaços públicos tem tido impacto negativo em manifestações pacíficas reprimidas com extrema violência como na morte do estudante Marcus Vinicius da Silva de 14 anos atingido com tiro nas costas quando estava se dirigindo para a escola. Parentes da vítima, estudantes e professores do Colégio Vicente Mariano ao fazer uma caminhada pacífica de protesto até a Linha Amarela foram reprimidos e ameaçados pela força policial. Os métodos utilizados pelas forças de segurança não têm obtido resultados significativos e merecem ser repensados. Em qualquer situação os mais elementares direitos humanos devem ser prioridade.
* Alcyr Cavalcanti, jornalista e antropólogo