LUIZ ANTONIO SIMAS -
Os mais chegados sabem que escrevi faz tempo um pequeno tratado sobre a hermenêutica do jogo da porrinha. Pois vejam a descoberta tardia que fiz ontem: inventaram um aplicativo para se jogar porrinha (ou purrinha, escolham) no celular.
Logo a porrinha, que tem como terreiro propício para a prática os botequins mais vagabundos, espaços de sociabilidades e ludicidades na selva urbana.
Saibam os incautos metidos a bestas que veem na porrinha um mero jogo de bebuns, que a origem do babado é o antigo Império Romano. Tá tudo lá nas crônicas de Seleno.
Os soldados de Roma costumavam praticar, nos intervalos das batalhas mais sangrentas, um jogo conhecido como Morra. Os jogadores escondiam uma certa quantidade de dedos da mão direita às costas e diziam um número. Aquele que acertasse o número exato era o vencedor. O troço era popularíssimo e Seleno conta sobre torneios no Coliseu que terminaram em matanças.
A porrinha é uma conquista da civilização tropical. O jogo de soldados romanos virou disputa de crianças e cachaceiros, com seus palitinhos, em quintais e bodegas do Brasil. O Coliseu das matanças foi substituído por botequins de esquinas. A prática exige contato, roda, interação, aposta sacana, zoação sadia, observação do outro. É prática de rua como espaço de encontro.
Essa porrinha virtual, cá pra nós, é feito aqueles aplicativos para se soltar pipa na telinha: coisa de mundo desvirtuado.
(Aproveito para vender meu peixe. No "Coisas Nossas", livro que lançarei na FLIP - e que já está em algumas livrariaria - há um texto em que falo da hermenêutica do jogo da porrinha que citei no início deste arrazoado.)
PS: baixei o aplicativo. Tou perdendo feio. (via facebook)