HÉLIO DUQUE -
A pobreza do debate público, no Brasil, não fica adstrita à sociedade, penetra com tentáculos poderosos na esfera política. A proposta do executivo de emenda constitucional para limitar o crescimento do gasto público vem sendo combatida por aqueles que não entendem a importância de uma gestão fiscal responsável. Sem forte ajuste nas contas públicas, impedindo que as despesas cresçam mais do que as receitas, torna-se impossível retomar o crescimento econômico com segurança. A conjuntura da brutal recessão econômica que mergulhou a vida nacional no vendaval da crise tem no descontrole das despesas públicas a sua origem. Não podemos mais esconder a verdade, colocando a mentira em seu lugar.
O Estado não é gerador de riqueza, mas arrecadador de tributos para devolver em benefício da sociedade, com investimentos em áreas essenciais para o desenvolvimento humano e econômico. Responsabilidade fiscal é um valor que deve ser cultivado pela sociedade, acima de preferencialidades pessoais ou ideológicas. O governante deve estar consciente do fato de buscar, em primeiro lugar, estruturar uma boa administração econômica para atingir os seus objetivos. Sem ela o fracasso é conquista garantida, como estamos assistindo no tempo presente. Governos voluntaristas, amantes do populismo submetidos ao corporativismo, geram a disfuncionalidade que afeta a institucionalidade do Estado.
Quando grupos organizados no Congresso Nacional ensaiam, através emendas, incabíveis, torpedear o programa de ajuste e limitação das contas públicas, é desejar a perpetuação da tragédia econômica e social. Tragédia que pode ser fotografada na recessão econômica dos últimos anos, com o desemprego superior a 11 milhões de trabalhadores e um déficit fiscal de mais de 10% do PIB (Produto Interno Bruto). Ou ainda: aumento da relação dívida bruta/PIB de 53% para 70%, além de déficit acumulado nos últimos anos em conta corrente de mais de 400 bilhões de dólares (admitindo-se o dólar a 3,20, em real seria 1,28 trilhão). Tem mais: uma taxa de inflação elevada, atingindo o poder aquisitivo dos assalariados e o mais grave, determinando brutal redução na inclusão social e distribuição de renda. A situação real da economia brasileira foi escondida da população por largo tempo, com a conivência dos partidos políticos que apoiavam o governo.
Lamentavelmente, para muitos homens públicos, política econômica e política social são coisas diferentes. Os populistas e os seus agregados infantilizados acreditam que a primeira é defensora dos ricos, poderosos e privilegiados, enquanto a segunda é uma conquista dos pobres e deve integrar o seu universo existencial. Nada mais falso. Elas estão integradas como irmãs siamesas. Não são compartimentos estanques, mas ligadas umbilicalmente. Os recursos gerados pela política econômica é que garantem o dinheiro para o investimento em educação, saúde, segurança, nos programas assistenciais e nos programas sociais. Não existe política social sem dinheiro, desde tempos imemoriais. Quando faltam recursos, a desigualdade social aumenta.
Nas últimas duas décadas, até 2014, a melhoria do padrão de vida de milhões de brasileiros permitiu que muitos ascendessem à baixa classe média. O aumento do desemprego e a inflação ascendente inverteu essa tendência de mobilidade social. Devolvendo para a parcela mais pobre da população amplos setores da emergente baixa classe média. A desigualdade foi dolorosamente nocauteada pelos desmandos e incompetência de uma política econômica irresponsável. Comprovando que sem crescimento da economia que gera emprego e salários melhores, é impossível garantir a ascensão social. A perversa e cruel realidade não foi fruto de maldade humana, mas responsabilidade de um governo que acreditava que os recursos públicos são infinitos, não aceitando disciplina e responsabilidade na administração do dinheiro público.
Os parlamentares brasileiros deveriam meditar sobre essa realidade, empenhando-se na aprovação das reformas sem as quais a crise econômica se agravará. O economista Mansueto Almeida, integrante do Ministério da Fazenda sintetizou o que nos aguarda: “Se o Congresso não quiser aprovar a PEC do crescimento do gasto nem reforma da Previdência, não terá ajuste fiscal.” Sem ajuste fiscal, o governo terá de se financiar com juros crescentes, levando a explosão da dívida pública. Seria a volta da inflação e um tiro fatal na retomada do crescimento econômico. Os grandes responsáveis serão os integrantes do Congresso Nacional.
*Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira.