CARLOS CHAGAS -
Mais importante do que a educada mas
firme declaração de guerra à presidente Dilma, feita pelos presidentes
da Câmara e do Senado, é saber quem induziu a chefe do governo a adotar
por decreto executivo o tal Sistema Nacional de Participação Social.
Porque tratou-se, mais do que de uma violência, de uma profunda agressão
à democracia que o Congresso acaba de repudiar pelos seus dirigentes
maiores.
Henrique Eduardo Alves suspendeu todas as votações no
plenário da Câmara durante o mês em curso, até que possa ser aprovado o
decreto legislativo que anula a iniciativa palaciana. Renan Calheiros
estimulou o decreto legislativo por considerar o decreto executivo,
número 8.243, um atentado ao Congresso e à democracia, inadmissível de
ser tolerado.
Pressionada, Dilma deu sinais de revogar a aberração,
substituindo-a por um projeto de lei a ser encaminhado ao Legislativo,
coisa que poderá acontecer nas próximas horas. Mesmo assim, fica a
indagação: quem fez a cabeça da presidente para criar instrumentos de
participação direta da sociedade em praticamente todas as decisões
nacionais, através de consultas a conselhos, comissões, ouvidorias,
audiências e demais mecanismos a cargo da sociedade civil e das redes
sociais equivale a substituir a democracia pela ditadura. Posto em vigor
o decreto, o Congresso estaria sendo substituído por entidades que
ninguém escolheu, muito menos votou, certamente manipuladas pelos grupos
que detém o poder, com o PT e penduricalhos à frente. Como o governo
havia liberado a informação de que o Secretário Geral da Presidência da
República cuidaria da aplicação dessa nova estrutura de ingerência nas
atribuições parlamentares, conclui-se ser muita areia para o caminhão de
Gilberto Carvalho. A inspiração terá vindo de cima. De quem? Claro que
do Lula, mesmo se algum companheiro burocrata lhe tiver vendido a ideia.
A impressão é de que a presidente, seu antecessor, o
PT e mais o grupo encastelado no poder entraram em parafuso, a partir
das pesquisas indicando a queda na popularidade do governo. Vale
qualquer coisa para reverter as tendências do eleitorado, inclusive
inconstitucionalidades. Porque esse decreto ofende nossa lei maior. Toda
participação popular é elogiável, desde que não atropele as
prerrogativas dos poderes da União. Faz muito que dispomos do juri, das
ações populares, do plebiscito, do referendo e de uma penca de conselhos
agregados à administração pública, mas com uma condição fundamental:
foram todos criados por lei, muitos inseridos na própria Constituição.
Estabelecer a participação social por decreto executivo caracteriza
monumental aberração institucional. Coisa de gente apavorada com as
eleições de outubro.
Esse falso assembleísmo significa ingerência
descabida dos movimentos sociais no processo decisório das políticas
públicas, daí a reação da quase totalidade de deputados e senadores, em
apoio aos presidentes da Câmara e do Senado. Um ato do Executivo não
pode dispensar o Legislativo. Como se ouvia ontem no Congresso, Renan e
Henrique Eduardo agiram sentindo o que disseram e dizendo o que
sentiram.