17.2.14

ROBERTO MONTEIRO PINHO: 'A JUSTIÇA DO TRABALHO NÃO É UM MONOPÓLIO DOS SEUS INTEGRANTES'

Via Jornal da ABI -

O subeditor do jornal Tribuna da Imprensa online e sindicalista afirma que a justiça trabalhista desatou o nó do compromisso social e se constituiu num mecanismo de cobrança de tributos para a União. Com a EC 45/04, veio à ampliação da sua competência, mas também o contra peso da execução fiscal da Previdência Social e da Fazenda Federal, com isso, o Estado ampliou sua demanda neste judiciário, que hoje possui 83% de ações públicas.

Por Daniel Mazola -
O livro JUSTIÇA TRABALHISTA DO BRASIL– o fenômeno social agoniza, (Editora Topbooks), do jornalista Roberto Monteiro Pinho que chega em breve nas livrarias, defende a tese de que a posologia social das Leis Trabalhistas, perdeu lugar para o pragmatismo da cobrança de tributos, se alojando no  interior dos tribunais, com isso empurrou as ações ordinárias dos trabalhadores para a eternidade. O autor explica que antes do ano 2000, quando essa justiça e tinha pluri composição com os sindicatos, a oxigenação era uma, hoje é traumático, estressante e engessada, perdeu a qualidade das decisões, e seus juízes que já eram limitados juridicamente, promovem o caos jurídico nas execuções. Antes de 2001, quando terminou o ciclo dos sindicatos nesta especializada a metade das ações em demanda judicial era resolvidas através de acordos, hoje, o juiz prefere judicializar e ganhar pontos para sua promoção por merecimento.
Monteiro explica que tão logo entrou em vigor, a nova formatação material da especializada, essa recebeu um lote de ações oriundas da justiça comum, na distribuição das execuções da Previdência Social (INSS) e da justiça federal as ações da Fazenda, com isso aos poucos, somado as execuções tanto nos acordos, como nas sentenças transitadas em julgado, os cálculos previdenciários entraram no bolo das execuções, sugando enorme tempo dos juízes e serventias, nesta nova relação com as procuradorias desses órgãos públicos e na tramitação das ações de cobrança dos tributos. Avalio que a União comemora o resultado, já que antes da EC 45/04, a execução fiscal da relação nos títulos dos contratos de trabalho, era lenta e de pouca eficácia na esfera das justiças estadual e federal. Ao contrário de priorizar as ações dos trabalhadores, a Justiça do Trabalho se constituiu num cartório de luxo, com estrutura onerosa para cobrar tributos federais. A partir daí, o monocracismo fincou pé na imaginária importância política, já que para barrar a extinção deste judiciário, a moeda de troca foi exatamente a cobrança desses tributos – explicou.
Monteiro avalia que os dirigentes, não conseguiram diminuir o fosso social que separa ricos e pobres no Brasil. Por outro, obrigou as forças do trabalho a firmar um pacto com setores mais conservadores da sociedade, onde o governo é o maior beneficiado. Ele ganha na origem, no meio e no fim do da relação de trabalho, com a arrecadação de tributos e a retenção de valores do INSS e do FGTS.
Trajetória do autor: Aos 18 anos em pleno regime ditatorial o autor estava trabalhando na Associação Beneficente dos Feirantes de São Paulo, uma das entidades mais representativas na época, e que reunia milhares de comerciantes atacadistas em mais de 20 feiras-livres realizadas diariamente na capital paulista. Sua atividade era a de associar membros, que mais tarde se converteria em sindicato, um dos mais antigos do país.Após longo período, mudou para o Rio de Janeiro, nos anos 70 passou pelo setor de transportes, quando fundou a Associação de Locação de Veículos do Rio de Janeiro – Aelotrava, hoje sindicato de locação de veículos. Durante o estado de exceção, inspirado na atuação de sua mãe na emblemática liga operária, militou e ajudou até a abertura política, os organismos de esquerda na proteção e apoio aos presos e aos exilados políticos. Na vida comunitária fundou dezenas de associações de moradores, quando disputou em 1982 a eleição para deputado no Rio de Janeiro pelo PTB. Editor, colunista e radialista,  apresentou programas na Rádio Imprensa FM e na Rádio Bandeirantes AM. Na militância política após participar em 1979 ao lado dos socialistas europeus, do Encontro de Trabalhistas no Exílio, na cidade de Lisboa. Monteiro  apostava na fusão do PTB de Ivete Vargas e o PDT, após fundar com Leonel Brizola sua agremiação. No jornalismo fundou o periódico Jornal da Cidade e sua editora de jornais e revistas, e passou a colaborar com o jornal Tribuna da Imprensa de Helio Fernandes, hoje seu amigo. Estudou sociologia e direito, mas acabou optando pela comunicação, sua paixão profissional. Ainda no regime militar nos anos 80 chegou ocupar a função de subeditor. Ingressou na Confederação Geral dos Trabalhadores - CGT, onde ocupou a diretoria de Relações Internacionais, quando foi nomeado juiz pela representação paritária na Justiça do Trabalho, tendo composto as Sétima e Nona Turmas, e dos Dissídios Coletivos - SEDIC.  Aposentado, é Assessor Especial da presidência da Ordem dos Advogados do Brasil, subseção Barra – Rio de Janeiro, se dedica a assessoria para assuntos institucionais de sindicalismo, e ao Blog Tribuna online, onde é subeditor ao lado de Helio Fernandes e o jornalista Daniel Mazola, seu colega na Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e dos Direitos Humanos da Associação Brasileira de Imprensa - ABI.

Jornal da ABI – Quais as diferenças sociais entre a justiça laboral de antes e a de agora?

Roberto Monteiro Pinho – As lutas sociais não se esgotaram, e cada vez mais se aguda, o capital é voraz e desumano, e usa a força de trabalho para auferir lucros, mas na hora de dividir essa riqueza só pensa em si mesma, e por isso o trabalhismo no Brasil ainda é a maior força ideológica ao lado da comunicação, os dois aliados, somam mais de que todo Congresso e pactos governistas, Essa força é imbatível, um é a ação a outra a divulgação, por isso são temidas pelos políticos. O direito de greve, a estabilidade do emprego, estão anexadas ao direito do trabalho que hoje avançou neste sentido, mas que se distanciou da sua maior essência, que é a entrega da mais valia, de forma ágil e eficaz. O governo usa a justiça laboral como seu cartório de luxo, e seus integrantes fazem vista grossa, porque se beneficiam com os mais altos salários do planeta.
Monteiro admite que o trabalhador  está no limite da tolerância.
Jornal da ABI: A demora na solução do processo do trabalho se deve exatamente a que?

Roberto Monteiro Pinho - O Brasil tem uma longa tradição de nação pacificadora. O número de ações trabalhistas cresceram de 2001 de 9 milhões para 15 milhões em 2012, 83% (fonte CNJ) delas o governo ou é réu ou é autor. Nas ações públicas os temas são complicados, estabilidade, desvio de função, violação as regras convencionadas, dispensas imotivadas, enfim uma gama de rubricas, que chegam até as demissões em massa das terceirizadas, onde na maioria dos casos, nem mesmo a verba salarial da dispensa foi paga. Antes de 2001 a representação paritária era a responsável por 55% dos acordos, hoje este número caiu pela metade, o juiz não leva nenhuma vantagem em conciliar, em nada acrescenta a sua carreira a conciliação, sendo que as sentenças são reconhecidas por merecimento como fator para sua promoção ao tribunal. Por outro com a demanda fiscal promovido com o advento da EC 45/2004, o congestionamento ampliou, já que a execução desses tributos são operados de oficio pelos magistrados. O mais grave, ai sim! está o “calcanhar de Aquiles” da especializada, é o excesso de preciosismo, sentença que são autenticas obras literárias, decisões conflitantes, avessas as normas legais, execuções eivadas de vícios e nulidades, isso tudo gera, recursos e recursos e com isso a ação ganha sobrevida e seu tempo de solução se estende por mais anos. Em suma: o que era para ser simples, se tornou complexo.

Jornal da ABI - No livro você aborda essas questões e oferece alternativas para a solução do problema?

Roberto Monteiro Pinho – Esse é o objetivo, muito já se falou sobre as mazelas do judiciário, mas a imprensa publica matérias sensacionalistas, que envolvem praticas lesivas, juízes corruptos, e isso é pouco diante da gravidade com a demora da solução de uma ação de trabalhador. È inconcebível que uma ação trabalhista demore anos para ser solucionada, e que hoje temos 45% delas insolucionáveis, sem liquidez, e uma das responsáveis por isso é a morosidade, Enquanto se discute leis, pequena diferenças, o processo ganha sobre vida, e se arrasta pelos tribunais, com isso as empresas fecham as portas, seus donos desaparecem e não mais existem bens a serem penhorados, e quem vai pagar por isso? O Estado é omisso quanto a essa questão, que não se discute ainda na cúpula dos tribunais e sequer no Congresso. De nada adianta fazer leis, aumentar o quadro de juízes e servidores, se não ataca o cerne da questão. A morosidade é fruto dos próprios erros dos atores da especializada. No livro eu aponto uma das alternativas a arbitragem extrajudicial, (lei 9.307/2006). Mas infelizmente a magistratura em flagrante reserva de mercado, combate sua aprovação no Congresso.

Jornal da ABI – O que pensam os advogados trabalhistas e a OAB?

Roberto Monteiro Pinho – Eu não advogo, meu filho sim, mas aqueles que enfrentam o dia a dia nos tribunais do trabalho padecem e muito. Inúmeras são as queixas, na subseção da OAB Barra, elas são constantes, e vão desde a violação das prerrogativas dos advogados (art. 133 da CF), a falta de esmero e trato social. As serventias e os juízes do trabalho, “se acham acima de tudo e de todos”, as reclamações dos profissionais são muitas neste sentido. É desconfortável trabalhar num ambiente onde predomina o cinismo e a prepotência. Uma simples petição demora meses para ser despachada, e quando o advogado quer falar com o juiz, não consegue, tamanha a barreira que se estabeleceu entre judiciário e advocacia. A Ordem tem atuado, mas é um universo muito grande e o volume de reclamações são muitas. O desagravo, instrumento de protesto da classe operado pelas OABs, não surte efeito, faz barulho, mas apenas fica a denuncia. Pior é quando o juiz ou serventuário comunica um incidente contra o advogado, o processo administrativo é acolhido e anda com rapidez, enquanto os juízes são corporativos, uma reclamação correcional pode levar anos e 97% p% delas sequer são apreciadas. Isso tem que mudar e Ordem deve trabalhar melhor este instituto, seria uma forma de mostrar um outro quadro a magistratura insolente. Uma sugestão seria substituir administrativos leigos por advogados ou bacharéis, evitando a deformação no atendimento a essas questões.

Jornal da ABI – Se não deve aumentar o quadro de juízes e servidores, o que o senhor sugere:

Roberto Monteiro Pinho – O judiciário trabalhista é o maior do mundo, são 24 tribunais regionais, 1600 varas trabalhistas e 500 postos avançados (extensão de varas) que atendem uma vez por semana em municípios limítrofes. No norte e nordeste temos cinco tribunais nanicos, que não julgam mais que cinco mil processos por ano, porque isso? Não se justifica tamanha despesa. O enxugamento das instâncias, também é um caso a ser pensado, com desembargadores presidindo e juízes de primeiro grau convocados formando turmas mutirão para atender a forte demanda de ações. Juízes trabalham apenas terça, quarta e quinta, são os “TQQ”, alegam que estão em casa fazendo sentenças, mas onde estão essas sentenças, se as varas estão com processos atrasados aos milhares. Insisto que o extrajudicial é a solução para acabar com a morosidade. Quando estive no tribunal eu estudei, observei e anotei. Um dia durante a sessão da Sétima Turma,ao meu lado uma desembargadora perguntou: Pinho porque você tanto anota? eu disse: estou fazendo estatística e penso um dia quando sair do tribunal escrever um livro.

Jornal da ABI – Além da pesquisa e sugestões anunciadas, o senhor também aborda a questão do acesso ao judiciário?

Roberto Monteiro Pinho – O Brasil possui 5.565 municípios, a justiça trabalhista não atende 30% deles, a maioria afastados dos grandes centros, pequena comarcas, lugarejos e com isso os trabalhadores precisam se deslocar por quilômetros, temos casos em que demora um dia, e o custo de transporte onera, principalmente aqueles hipossuficientes que não dispõe de renda e sequer recebeu seus últimos salários. Geralmente são os trabalhadores rurais, um grupo relegado ao esquecimento das autoridades, que engrossa os milhares de trabalhadores menores e escravos. Isso é justiça que se faça? Evidente que não! Mas é o quadro que temos, enquanto isso o Tribunal Superior do Trabalho - TST tem suntuosa sede, com um estacionamento para 5 mil carros, os tribunais regionais em sua maioria são autênticos palacetes, intimidam, oprimem. Temos casos que ao chegar numa audiência, o trabalhador foi barrado por um juiz vestal, indolente, porque calçava “chinelos de dedos”, proibido de sentar a mesa de audiência. Essa não é a justiça preconizada no bojo de sua criação, isso é obra de malfeitores, delinquentes insanos, soberbos vestidos de toga, que infestam esse judiciário, a ponto de até mesmos seus colegas condenarem essa postura, mas que infelizmente são minoria. O acesso que me refiro é esse, para o estado o trabalhador que procura a justiça estatal é invisível. Já o acesso pela via do instituto da postulação em causa própria, também saiu do contexto. Hoje em dia, o juiz não aceita que o trabalhador compareça em juízo sem advogado, então o jus postulandi é letra morta na CLT.