ANDRÉ DE PAULA -
O
racismo e o preconceito que invadem impiedosamente a nossa sociedade atingem
também, pasmem os senhores, a própria Justiça.
A intolerância hedionda contra o islamismo que se espalha
mundialmente, encontra acolhida, infelizmente, em nossos combalidos Tribunais.
Todo islâmico torna-se, agora, criminoso em potencial. É a mesma coisa que
apregoar que todo cidadão estadunidense é criminoso só porque o presidente o é.
Católico e marxista que sou (não vejo contradições
significativas, pois o cristianismo cuida do homem todo e o marxismo é
ferramenta de transformação da sociedade, de todos os homens). Por conseguinte,
não hesitei um segundo em advogar para Kleiton França, acusado pelo Ministério
Público Federal de Goiânia e perseguido pela grande imprensa de pertencer ao
grupo de aplicativo WhatsApp, “Revolucionários Islâmicos”, cujo objetivo seria,
supostamente, difundir e defender ideias extremistas, inclusive para
planejamento de possíveis atentados em território brasileiro.
Kleiton é dependente químico de álcool e drogas, faz tratamento
para se livrar da doença que o aflige e está, por isso, com seu senso crítico
reduzido.
O grupo citado, na verdade é uma espécie de jogo como, por
exemplo, “Role-playing game-RPG”, “Dungeons & Dragons” e“Vampire:
The Masquerade”, onde jogadores interpretam personagens vilânicos.
Quem num acesso de raiva, da boca para fora, já não falou: “Tem
que jogar uma bomba no Congresso Nacional, pois esta casa é absolutamente
corrompida”. Isto significa que vai concretizar o ato ou
apologia ao terrorismo?
Sob o efeito de drogas, entrou o pobre coitado no grupo apenas
para se divertir, não tinha seriedade ou tirocínio para participar de qualquer
atentado terrorista. Não teve qualquer dolo que seja. Não há o elemento
subjetivo do injusto de violar a legislação antiterrorismo ou de expor a vida
ou a integridade de qualquer pessoa. Até porque o tal grupo parece ser apenas
um jogo. E esta conotação preconceituosa e intolerante reforçada por parte da
grande mídia foi inventada pelo governo para justificar as violentíssimas
repressões que vem efetuando.
O Brasil nunca foi palco de ações terroristas de grupos
islâmicos. Imputar a um simples grupo de WhatsApp, composto apenas por nove
pessoas, organização criminosa, sem divisão de tarefas e sem a prática de
qualquer fato concreto que indicasse que se praticaria uma ação, sem vantagem
de qualquer natureza, sem ligação com células de quaisquer grupo terrorista,
sem qualquer ato preparatório, sem posse de nenhuma arma ou material explosivo, na verdade, soa como piada.
Incluí-los na Lei antiterrorismo é brincadeira de mal gosto que
onera nossa carcomida Justiça e resulta em pesadelo cruel para os nove
internautas.
Lamentavelmente, esta lei criada no governo Dilma tem servido
para criminalizar os movimentos sociais e justificar o aumento da repressão que
criou presos políticos como os 23 das jornadas de 2013 contra o aumento das passagens,
de Rafael Braga, de Jair Baiano, ex-membro da FIST, padre Amaro e agora do
indigitado cidadão negro também ex-morador de uma de nossas ocupações, doente
químico e réu sem nenhum antecedente criminal.
* André de Paula é
membro da Anistia Internacional e advogado da Frente Internacionalista dos Sem
Teto (FIST)