10.12.16

SALÁRIOS E NÚMERO DE PARLAMENTARES NÃO SÃO A RAZÃO DA CRISE BRASILEIRA

JOSÉ CARLOS DE ASSIS -


Na Alemanha dos anos 30 o culpado pela crise era o judeu. No Brasil atual o culpado apontado na internet é o parlamentar que ganha dinheiro demais. Não é o parlamentar que vende seu voto à banca privada, que financia suas campanhas milionárias com dinheiro de empreiteiras, que rouba na emenda parlamentar para compra de ambulâncias. A suprema imbecilidade de inspiração fascista de que a crise vai ser resolvida reduzindo o número e o salário dos parlamentares é resultado de uma avaliação superficial do processo político e da estrutura parlamentar por parte de quem não tem a menor noção do que está falando.

O parlamentar brasileiro típico, quando corrupto, não se candidata para ganhar salário. Candidata-se para ter poder e usá-lo para a corrupção passiva. O salário, as mordomias, o gabinete são apenas meios de acesso funcionais comuns a contratos milionários, dentro ou fora da estrutura do Estado, que se traduzem em receitas de milhões de reais. Compare o salário, maior que seja, de um parlamentar com o custo de sua campanha política. É desproporcional. A campanha política custa dez, vinte vezes mais que o valor do salário e das mordomias correspondentes. Por que o candidato gastaria tanto dinheiro para tão pouco?


Essa campanha que graça na internet para a redução do número, do salário e das mordomias dos deputados e senadores, e que junta galhos com bugalhos, é um besteirol de inspiração fascista para desviar a atenção do principal. Parece que as pessoas não estão compreendendo o que a operação Lava Jato revelou: propinas milionárias, centenas de vezes o salário de um deputado ou senador, oferecidas pelas empreiteiras com a retaguarda de empresas públicas, notadamente a Petrobrás. É aí que tem de ser atacado o problema. O vínculo entre parlamentar e financiamento empresarial de campanhas tem que ser rompido.


É claro que pode ser estabelecido um limite para ganhos lícitos dos parlamentares. Tem que levar em conta o tamanho do país, a estrutura de um governo concentrado em Brasília, a necessidade de contatos com as bases nos Estados, e todo um processo de relações com os representados que custa dinheiro num país continental. Em contrapartida, é preciso levar em conta que, sem determinadas mordomias, pobre não pode ser deputado ou senador. Esses cargos teriam que ser reservados exclusivamente aos ricos que poderiam arcar com as respectivas despesas. E os pobres ficariam sem representação no parlamento.


Quando Péricles, o líder democrático grego oriundo de duas famílias aristocráticas, chegou ao poder de Atenas, só aristocratas ricos podiam exercer cargos públicos. Ele acabou com isso, criando salários para cidadãos pobres que concorressem ou fossem indicados por sorteio a magistraturas. Esse princípio subsistiu em todas as democracias criadas na Idade Moderna sob inspiração ateniense. Naturalmente que o sistema pode ser distorcido quando os parlamentares, legislando sobre seus próprios salários, decidem aumentá-los injustificadamente. Mesmo isso, porém, não representa

motivo para crise econômica.



O que está acontecendo, quando se levantam grandes protestos contra salários de parlamentares, é a reprodução do fascismo e do nazismo naquilo que tinham para desviar a opinião pública dos problemas centrais. O inimigo do povo brasileiro, o inimigo da nação, o inimigo do desenvolvimento é a banca privada, infelizmente em conluio com a banca pública e o Banco Central. Sintomaticamente, não há banqueiros ou financistas arrolados nos crimes da Lava Jato. Assim, não temos crise por conta de salários de parlamentares. Temos crise porque se construiu um sistema de dívida pública, alimentada por taxas de juros oficiais escorchantes, que estrangula o sistema produtivo e mantém a economia em depressão.