Por ORLANDO ZACCONE - Via Brasil de Fato -
Estamos diante de um massacre sistêmico, homologado pelas autoridades jurídicas e aplaudido por setores da sociedade.
O anúncio da morte do traficante mais procurado pela polícia do Rio de Janeiro, Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy, no último dia 08, no Morro da Pedreira, é mais uma peça no museu de grandes novidades das políticas de segurança pública com derramamento de sangue em nosso estado. Naldo, Lulú, Bem-Te-Vi, Gangan, Matemático, todos “mortos em confronto”, são apenas alguns nomes “famosos” de uma estatística macabra. Segundo o relatório da Anistia Internacional “Você matou meu filho”, as polícias no Rio matam em média duas pessoas por dia. Foram 8466 mortas a partir de ações policiais entre 2005 e 2014. Para além de alguns traficantes conhecidos, sobra uma quantidade imensa de pessoas executadas que não tem nome e nem fama; aqueles cuja situação política nos remete a uma das linhas do personagem A peste, na peça Estado de Sítio, de Albert Camus: “Fareis parte da estatística e ireis, enfim, servir de alguma coisa”.
Fala-se muito em “violência policial”, mas pouco se fala que estas mortes são legitimadas por instrumentos jurídicos no interior do Estado de Direito. A decisão de arquivamento dos autos de resistência, nomenclatura utilizada para diferenciar as ações letais produzidas por policiais em serviço dos crimes de homicídio, contempla esta violência como uso legal da força. A polícia mata, mas não mata sozinha. Promotores e magistrados da Justiça Criminal participam de uma política de extermínio ao decidirem que a identificação do inimigo, na figura fantasmática do “traficante de drogas”, em ações que ocorrem no interior de favelas e guetos, são elementos suficientes a contemplar a legalidade da ação policial. O que está em jogo não é a forma como a ação policial se desenvolveu, mas sim em relação a quem se dirigiu. Era traficante ou pedreiro? Era traficante ou dançarino? Dependendo da resposta lá se vão alguns praças e soldados para a cadeia ou para a promoção.
Estamos diante de um massacre sistêmico, homologado pelas autoridades jurídicas e aplaudido por setores da sociedade. O que a grande maioria dos policiais civis e militares não percebe é que esta política de extermínio só favorece ao poder político corrompido. A vida de um policial tem o mesmo valor da vida de um traficante para o Estado assassino e para a mesma parcela da sociedade que clama por sangue. Vidas sem valor de vida, vidas indignas de serem vividas. Enquanto os indignos de farda e sem farda entregam suas vidas numa guerra sem fim, os negócios da segurança e a segurança dos negócios prosperam na Cidade Maravilhosa. As Olimpíadas 2016 deverão custar 36,7 bilhões. Após o fim dos jogos, os moradores das favelas cariocas, bem como os policiais do nosso estado, estarão na mesma situação de desprezo e penúria. E para a sociedade carioca ficará o legado de um imenso campo de golfe construído numa reserva ambiental. Não tenho dúvidas, a guerra é o ópio do povo!
*Orlando Zaccone é delegado da Polícia Civil.



