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“A proposta de reforma da Previdência apresentada pelo governo (PEC nº 06/2019 e Medida Provisória n.º 871/2019) afeta duramente os trabalhadores e trabalhadoras rurais e tem o viés de excluir a maioria desses segurados do sistema de proteção social vigente.” A denúncia é da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais e Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag), em artigo publicado em 29 de abril, no Valor.
No texto, o presidente da entidade, Aristides Santos, e a secretária de Políticas Sociais, Edjane Rodrigues, lembram que estudos feitos com base no Censo Agropecuário apontam que a renda monetária líquida anual da agricultura familiar é muito baixa.
“Em 61% dos estabelecimentos agropecuários, caracterizados como agricultura familiar, a renda monetária líquida anual identificada foi em valor inferior a R$ 1.500, sendo que em aproximadamente 50% dos estabelecimentos essa mesma renda não chega a R$ 300 ano. Isso demonstra que a maioria dos agricultores familiares, denominados segurados especiais, não tem capacidade de contribuir com regularidade para a Previdência”, informa o artigo.
A Contag questiona a proposta do governo Jair Bolsonaro, de instituir uma contribuição anual fixada, inicialmente, em R$ 600 por grupo familiar. “Desde a Lei Complementar nº 11/71 e mesmo após a Constituição de 1988, os trabalhadores rurais que exercem a atividade agropecuária por contra própria têm acesso à proteção previdenciária mediante a comprovação do trabalho rural, e participam do custeio mediante a aplicação de uma alíquota de 1,5% incidente sobre a venda da produção rural.”
A razão para isso, explicam os agricultores, deve-se ao fato de a produção de alimentos ser atividade de alto risco, “sendo comum o agricultor familiar perder a produção devido a situações de emergência ou de calamidade, como secas, excesso de chuva, ataque de pragas na lavoura, ou ainda ter de vender o produto rural por um preço que não paga o custo de produção por não dispor de sistemas de armazenagem”.
O artigo critica, ainda, a elevação do período de carência para a aposentadoria por idade para um mínimo de 20 anos de contribuição, que deixará enorme contingente de segurados rurais longe do acesso ao benefício, especialmente os rurais que vendem sua força de trabalho a terceiros. “De acordo com a Pnad/IBGE (2015), dentre os 4 milhões de assalariados rurais, aproximadamente 60% trabalham na informalidade... Exigir desses trabalhadores 20 anos de contribuição para acesso à aposentadoria significa excluí-los desse direito protetivo, não só pela informalidade das relações de trabalho, mas também pela dificuldade que terão para manter-se executando um trabalho penoso e exaustivo por período superior a 40 anos.”
A reforma tem também aspectos nocivos para as trabalhadoras rurais: a elevação de 55 anos para 60 anos para ter direito à aposentadoria, diante da penosidade do trabalho e o início precoce da atividade laboral. Sete em cada 10 mulheres do campos começaram a trabalhar antes de completar 15 anos de idade.
“Isso significa, pelas regras atuais, que a aposentadoria no valor de um salário mínimo é acessada após longos e exaustivos 40 anos de trabalho rural. Ao elevar a idade de aposentadoria para 60 anos, as trabalhadoras rurais que conseguirem ter acesso a tal direito terão cumprido 45 anos de trabalho penoso, em dupla ou tripla jornada, muitas vezes sem finais semana, feriados e férias para descansar, pois o labor rural não permite.”
Exclusão, pobreza e êxodo rural - Para os representantes da Contag, a Medida Provisória 871/2019 afeta a Previdência rural e aumenta a exclusão, diante da intenção do governo de, a partir de 2020, reconhecer direitos apenas dos trabalhadores rurais segurados especiais que estiverem cadastrados e com informações atualizadas no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS-Rural).
“Tais medidas dificultarão o acesso aos benefícios previdenciários rurais, tendo em vista que a maioria dos segurados especiais não tem informações cadastrais atualizadas nas bases de dados do governo. Tampouco os segurados conseguirão comprovar o recolhimento de contribuição previdenciária devido à dificuldade que enfrentam para formalizar a venda da produção rural.”
Se as propostas do governo passarem, avaliam os agricultores, “além da exclusão de milhões de trabalhadores e trabalhadoras rurais da proteção previdenciária, haverá aumento da pobreza no campo, saídas em massa de pessoas do campo para a cidade, podendo ainda comprometer a segurança alimentar da população brasileira já que o benefício previdenciário é um estímulo para que os agricultores familiares mantenham-se no campo e na produção de alimentos – o que reduzirá a quantidade produzida e o consequente aumento dos preços, gerando inflação”.
E isso não afetará apenas os trabalhadores rurais, mas a economia de pequenos e médios municípios, dada a importância que os benefícios previdenciários rurais têm no PIB per capita dessas cidades, afirmam os dirigentes da Contag.
Fonte: CUT