CULTURA -
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CIUMIDADES
(Marcelo Mário de Melo)
A
quem se destinou aquele olhar enviesado?
Foi
mesmo casual o encontro com o/a colega?
Quem
é o/a novo/a amiguinho/a. E qual o interesse?
Por
que a amizade com um/a ex?
O
amor anterior está mesmo zerado?
Não
é suspeita tanta intimidade
do/a
amigo/a na sua casa?
Como
tecer ciúme sem briga nem intriga?
Como
dançar melhor a dança da desconfiança?
Onde
encontrar a segurança preventiva?
Qual
o caminho para blindar o amor?
***
EVOLUÇÃO
(Antero de Quental)
Fui
rocha em tempo, e fui no mundo antigo
tronco
ou ramo na incógnita floresta…
Onda,
espumei, quebrando-me na aresta
Do
granito, antiquíssimo inimigo…
Rugi,
fera talvez, buscando abrigo
Na
caverna que ensombra urze e giesta;
O,
monstro primitivo, ergui a testa
No
limoso paúl, glauco pascigo…
Hoje
sou homem, e na sombra enorme
Vejo,
a meus pés, a escada multiforme,
Que
desce, em espirais, da imensidade…
Interrogo
o infinito e às vezes choro…
Mas
estendendo as mãos no vácuo, adoro
E
aspiro unicamente à liberdade.
***
DYLAN THOMAS
A
força que impele através do verde rastilho a flor
impele
os meus verdes anos; a que aniquila as raízes das árvores
é
o que me destrói.
E
não tenho voz para dizer à rosa que se inclina
como
a minha juventude se curva sobre a febre do mesmo inverno.
A
força que impele a água através das pedras
impele
o meu rubro sangue; a que seca o impulso das correntes
deixa
as minhas como se fossem de cera.
E
não tenho voz para que os lábios digam às minhas veias
como
a mesma boca suga as nascentes da montanha.
A
mão que faz oscilar a água no pântano
agita
ainda mais as da areia; a que detém o sopro do vento
levanta
as velas do meu sudário.
E
não tenho voz para dizer ao homem enforcado
como
da minha argila é feito o lodo do carrasco.
Como
sanguessugas, os lábios do tempo unem-se à fonte;
fica
o amor intumescido e goteja, mas o sangue derramado
acalmará
as suas feridas.
E
não tenho voz para dizer ao dia tempestuoso
como
as horas assinalam um céu à volta dos astros.
E
não tenho voz para dizer ao túmulo da amada
como
sobre o meu sudário rastejam os mesmos vermes.
*Tradução: Fernando Guimarães.