Por LÚCIO FLÁVIO PONTO - Via blog do autor -
Gerações de admiradores de Federico Garcia Lorca devem ter se sentido
aliviadas com a informação de que foi localizado, na semana passada, um
documento que comprova, pela primeira vez, a responsabilidade do
governo espanhol pela morte do grande poeta e dramaturgo, fuzilado em
1936, quando tinha 38 anos.
O documento, descoberto por uma emissora de televisão da Espanha, é
um informe policial datado de 9 de julho de 1965, 29 anos depois da
morte de Lorca. Em resposta a um pedido da hispanista francesa Marcelle
Auclair, que trabalhava em uma biografia sobre o poeta, informa que
soldados das forças de segurança do regime franquista detiveram o poeta e
o levaram à sede do governo civil de Granada, cidade onde o escritor
nasceu e viveu.
Lorca foi preso pelas forças antirrepublicanas acusado de ser
socialista, maçom e pela prática de “homossexualismo e aberração”. Foi
conduzido imediatamente a Viznar, cidade próxima a Granada, e lá
fuzilado após “confessar”. A guerra civil espanhola, que seria uma
antecipação da Segunda Guerra Mundial, tinha apenas um mês de duração.
Perduraria por três anos.
O relatório foi preparado por um policial da 3ª Brigada Regional de
Investigação Social de Granada, a pedido do Ministério das Relações
Exteriores, acionado pela embaixada espanhola em Paris, a quem a
pesquisadora recorreu. Mas a resposta foi retida pelo governo espanhol,
que ainda era comandado pelo ditador Francisco Franco. Ficou retida em
um escaninho da burocracia oficial O franquismo se manteve no país de
1939 a 1976.
Franco morreu de morte natural ainda no poder, o que não fornece boa
moral sobre as ditaduras. Mas se ele venceu a guerra temporal, a disputa
pela eternidade foi vencida por Federico Garcia Lorca. Milhões de
pessoas ainda o leem e foram por ele influenciadas, como eu, na distante
Belém do Pará, que partilho com meus leitores a emoção diante da
comprovação oficial do vínculo dos franquistas com a execução de Lorca,
já relatada por muitos biógrafos, sobretudo Ian Gibson.
Seu corpo, como o de Saint-Exupéry, desaparecido durante uma viagem
de avião no mar, jamais foi encontrado. Virou nuvem, vento, emoção,
saudade.
Talvez para reforçar a convicção de que seu espírito jamais fenecerá.
