Por HELENA STHEPHANOWITZ - Via RBA -
Um dos fatos jornalísticos importantes na quarta-feira passada (6)
foi o cumprimento de um mandado de busca e apreensão no gabinete do
presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A
diligência foi pedida pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot,
e autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori
Zavascki, dentro do inquérito que investiga o suposto envolvimento de
Cunha na Operação Lava Jato.
Cunha está sendo acusado de ter arquitetado a elaboração de dois
requerimentos de informações sobre uma empresa contratada pela Petrobras
que, segundo delação do doleiro Alberto Youssef, teriam sido feitos
como forma de pressão para o pagamento de propinas. Os pedidos foram
apresentados na Câmara em 2011 pela hoje prefeita de Rio Bonito (RJ),
Solange Pereira de Almeida, na época suplente de deputado. Mas registros
eletrônicos mostram Cunha como autor desses requerimentos.
Durante delação premiada, o doleiro Alberto Youssef afirmou que Cunha
receberia propinas sobre um contrato de aluguel de navio-plataforma das
empresas Samsung e Mitsui com a Petrobras. Disse que quem intermediaria
o pagamento ao PMDB seria Júlio Camargo, representante das empresas. E
que as empresas suspenderam o pagamento da comissão a Camargo, o que
interrompeu os pagamentos ao PMDB. Youssef disse que Eduardo Cunha pediu
“a uma comissão do Congresso para questionar tudo sobre a empresa Toyo,
Mitsui e sobre Camargo, Samsung e suas relações com a Petrobras,
cobrando contratos e outras questões (…) este pedido à Petrobras foi
feito por intermédio de dois deputados do PMDB”. Segundo o doleiro,
seria para fazer pressão sobre as empresas para retomar os pagamentos.
O que reforçou as suspeitas do Ministério Público Federal foi o fato
de que os requerimentos mencionados por Youssef de fato foram
apresentados na Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara por
Solange Almeida. Ela assumiu ser a autora do requerimento, mas
demonstrou não dominar o assunto, parecendo não ser ela a mentora do
requerimento. Tanto Solange como Cunha admitiram que assessores do atual
presidente da Câmara ajudaram a elaborar e redigir o documento.
As propriedades digitais do arquivo com o texto do requerimento que
estava no site da Câmara, onde aparecia o nome do autor do documento:
Eduardo Cunha. Esta notícia levou Cunha a demitir o diretor do Centro de
Informática da Casa, Luiz Antonio Souza da Eira. Já ex-diretor, Eira
prestou depoimento ao Ministério Público, que teria sido a gota d’água
para pedir o mandato de busca e apreensão.
Essa é a notícia, e seria salutar que o Jornal Nacional, depois
de narrar os fatos, objetivamente ouvisse a versão de Cunha. Mas o
jornal inverteu as bolas. Colocou como protagonista da notícia não o
fato, mas a defesa de Cunha, a começar pelo título “Presidente da Câmara
classifica busca de documentos desnecessária”. O texto sucinto,
bastante ameno, foi apenas lido batido pelo apresentador William Bonner,
sem infográficos explicativos que contextualizem os fatos, sem imagens
da operação de busca, sem declarações de viva voz de Cunha, nem de
nenhum membro do Ministério Público. Completamente diferente de como são
noticiadas outras ações da Operação Lava Jato quando os alvos foram
pessoas ligadas ao PT.
Na prática, o jornal minimizou a notícia e praticamente fez o texto
que a assessoria de imprensa do deputado faria. Um vexame jornalístico.
A diferença de tratamento no noticiário para fatos idênticos – e que
teriam maior dimensão pelo cargo que Cunha ocupa –, conforme o
alinhamento político com os interesses da emissora, demonstra a clara
parcialidade do jornalismo. Persegue os “desafetos” que pensam e agem
diferente dos interesses da emissora, enquanto protege os “amigos”,
alinhados com os interesses empresariais, econômicos e de poder.
Cunha tornou-se “amigo” da mídia oligárquica ao declarar-se contrário
a qualquer marco regulatório para democratizar as comunicações. Tem
colocado em votação a pauta conservadora e reacionária pedida em
editoriais do jornal O Globo, como o Projeto de Lei 4.330, da
terceirização ilimitada, que precariza os direitos do trabalhador. E
promoveu uma sessão solene na Câmara para bajular os 50 anos de fundação
da TV Globo, apesar de a emissora ter apoiado a ditadura, que chegou a
fechar o Congresso por mais de uma vez. Além disso, volta e meia, tem
espezinhado o governo Dilma com uma pauta oposicionista bem ao agrado do
jornalismo que a Globo vem praticando.
Não é a primeira vez que o JN protege Cunha de desgastes
políticos, minimizando uma notícia desfavorável a ponto de praticamente
retratá-lo como vítima acima de qualquer suspeita. Na noite do último
dia 28, quando a Folha de S. Paulo publicou o documento citado
acima, o telejornal deu vexame semelhante em uma matéria com o título
“Cunha nega autoria de requerimento sob suspeita na Operação Lava Jato”.
Em entrevista ao programa Fantástico no ano de 2011, a então
entrevistadora Patrícia Poeta perguntou à presidenta Dilma Rousseff
sobre “toma-lá-dá-cá” nas relações com parlamentares. Talvez encontrasse
respostas nas atuais relações fraternas de Eduardo Cunha com a emissora
em que trabalhou.



