Por LEONARDO BOFF- Via O Tempo -
Uma das palavras mais difamadas na linguagem política neoliberal e capitalista é “socialismo”. Entende-se o porquê, pois ele comparece na história como um projeto alternativo à perversidade do capitalismo.
Alega-se que o socialismo nunca deu certo em nenhum lugar do mundo.
Talvez uma das razões de manter o boicote à Cuba socialista por tantos
anos da parte dos Estados Unidos se deva à vontade de mostrar ao mundo
que o socialismo realmente não presta e não deve ser buscado como forma
de organização da sociedade. E Obama teve que reconhecer que os EUA
fracassaram. O capitalismo não é a única forma de organizar a produção e
uma sociedade.
É forçoso reconhecer que aquele socialismo nunca foi o socialismo
pensado por seus teóricos, há três séculos. Na verdade, era um
capitalismo do Estado autoritário. Mas, se tomarmos como parâmetro
critérios humanísticos, éticos e sociais mínimos, devemos reconhecer que
o produtivismo, em geral, e o capitalismo também não deram certo.
ENRIQUECIMENTO ILIMITADO
Como pode dar certo um sistema que se propõe um mesquinho ideal de
enriquecimento ilimitado, sem qualquer consideração? Devastou e continua
devastando ecossistemas inteiros, desflorestando grande parte da área
verde do mundo, envenenando os solos, poluindo as águas, contaminando o
ar, erodindo a biodiversidade na razão de 100 mil espécies de seres
vivos por ano, destruindo a base físico-química que sustenta a vida e
pondo em risco o futuro de nossa civilização, suscitando a imagem
tétrica de uma Terra depredada e coberta de cadáveres e eventualmente
sem nós como espécie humana.
Esse sistema serve bem apenas a cerca de 2 bilhões de pessoas, que se
afogam no consumo suntuoso e no desperdício atroz. Ocorre que somos já
mais de 7 bilhões de pessoas, das quais quase 1 bilhão vive na mais
canina pobreza e miséria. Mais ainda: os cálculos foram feitos, se esse
sistema quisesse universalizar o bem-estar dos países opulentos,
precisaríamos de pelo menos três Terras iguais a esta.
Que sistema atenderá as necessidades fundamentais da humanidade
carente? Não será o capitalismo, que traz logo duas injustiças: a
social, com a riqueza de poucos e a pobreza de muitos, e a ecológica,
com a devastação maciça da natureza.
ECOSSOCIALISMO
Deixando de lado os vários tipos de socialismo, restringimo-nos ao
ecossocialismo contemporâneo. Surgido nos anos 70, com Raymon Williams,
James O’Connor, Manuel Sacristán e Michael Löwy, ele afasta-se dos
socialismos anteriores e apresenta uma proposta radical que “almeja não
só a transformação das relações de produção, do aparelho produtivo e do
padrão de consumo dominante, mas, sobretudo, construir um novo tipo de
civilização, em ruptura com os fundamentos da civilização
capitalista/industrialista ocidental moderna”.
Os tópicos principais dessa proposta foram expostos no Manifesto
Ecossocialista Internacional (2001), que deu origem à Rede
Ecossocialista Internacional (2007). Na Declaração Ecossocialista de
Belém (2007), se diz claramente: “A humanidade enfrenta hoje um escolha
extrema: ecossocialismo ou barbárie…” Essa proposta se alinha ao que
também propõe a Carta da Terra, aprovada e assumida pela Unesco em 2003.
Dentro de pouco, seremos todos ecossocialistas não por opção
ideológica, mas por razões matemáticas: dispomos apenas de escassos bens
naturais com os quais devemos atender a toda a comunidade de vida. Ou
repartimos tais bens com um mínimo de equidade entre todos, ou não
haverá uma Arca de Noé que nos salve. É vida ou morte.
