Por MINO CARTA - Via Carta Capital -
A mídia se esforça para nos confundir. Diante do balanço da Petrobras,
evidente a tentativa de devolvê-la ao projeto entreguista de FHC.
Ilustra esta página a primeira capa deste ano, belo exemplo do jornalismo que CartaCapital
pratica. Honesto, fiel à verdade factual, responsável, crente da melhor
lida com o vernáculo. Naquela mesma ocasião, a mídia nativa dedicava
seu verbo mais retumbante à chacina na redação do Charlie Hebdo e clamava contra mais um atentado contra a liberdade de imprensa e de expressão.
CartaCapital optou por outra visão
das coisas da vida e escolheu o assunto que iria inquietar o País nos
meses seguintes, dominar a cena política e criar problemas crescentes
para o governo recém-empossado de Dilma Rousseff. A mídia, com as
habituais exceções, preferiu banalizar a tragédia. Abandonou-se à
correnteza, seguiu o exemplo do jornalismo mundial, conforme manda a
tradição colonial. Com os resultados almejados: até brasileiros foram em
espírito à la place, assim como hoje marcham de corpo presente pelas avenidas aos gritos de foradilma.
A cretinização é fenômeno
mundial e os comportamentos midiáticos contribuem notavelmente para
tanto. O massacre cometido na redação do jornal satírico parisiense é
crime hediondo. Ganha, porém, uma repercussão que outros fatos tão
graves não têm, sem contar as interpretações rasteiras. Vale perguntar
aos nossos botões, desde que saibamos ouvi-los, por que não vamos à
praça ou à avenida, diante de outros crimes contra a humanidade,
perpetrados ou não por grupos islamitas?
Não nos incomodamos, por exemplo, se 250
estudantes são sequestradas pelo Boko Haram e delas nada mais se sabe.
Ou com a chacina de cristãos em pontos diversos do mapa africano. E
perfeitamente indiferentes recebemos as notícias da espantosa situação
dos fugitivos da miséria e da prepotência que atravessam o Mediterrâneo
em busca de praias seguras, e que soçobram pelo caminho. Falam de
milhares de mortos, entregues à sanha de organizações criminosas e
tragados pelas ondas de rotas odisseicas. Vítimas da desigualdade social
de um mundo cada vez mais injusto, com o beneplácito da aceitação
passiva do neoliberalismo e do silêncio de quem teria condições de
reagir.
A tragédia mediterrânea resulta, em primeiro lugar, dos
erros seculares, da violência e da arrogância dos poderosos do Ocidente,
a decidirem unilateralmente, a partir daqueles que veem como seus
exclusivos interesses, os destinos da África e do Oriente Médio. E de
todos aqueles que não sabem, ou não querem, ouvir seus botões.
Aqui na nossa cena, o
ataque midiático à razão mira, entre outros alvos, a situação da
Petrobras, nossa estatal que Fernando Henrique Cardoso pretendia
privatizar. Pois a inegável crise da companhia alegra jornalões e
revistões. Os fatos falam claro, mas o primeiro objetivo é atingir o
governo e o PT. Entre os participantes da festa, ninguém, obviamente,
se digna avisar o público a respeito do efeito negativo da queda do
preço do petróleo sobre os balanços de todas as companhias petrolíferas
do mundo.
Transparente, de todo modo, é outra manobra: a tentativa de
agarrar pelos cabelos a fugidia oportunidade de reconduzir a Petrobras
ao projeto do governo FHC. Não é por acaso que nas páginas da imprensa
se aventa como inevitável a venda do pré-sal, a despeito do enérgico
desmentido do presidente Bendine.
Certos comportamentos em outros tempos
eram definidos como entreguistas. Nada de surpresas. Exemplo: nas mais
altas esferas da Fiesp, órgão mais representativo da mentalidade da
indústria brasileira, há quem defenda com olhos radiantes a substituição
das empreiteiras brasileiras pelas chinesas.
O relato das efetivas condições da
Petrobras está na reportagem de capa desta edição, para concluir que a
situação é melhor, muito melhor, do que gostaria a mídia nativa.
